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Edgar Jacobs

A possibilidade de antecipação de formatura dos cursos da área de saúde e o STF

A Lei 14.040/2020 trata das normas “educacionais excepcionais a serem adotadas durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020”. Continha, basicamente, dois temas: regras para adaptação de calendários acadêmicos e a possibilidade de antecipação de formatura de cursos como medicina, odontologia e farmácia. E, por regular o decreto de calamidade limitado a 31 de dezembro de 2020, não está mais em vigor.


O Conselho Nacional de Educação (CNE) expediu resolução detalhando e prorrogando as medidas de ajuste do ano letivo sem mencionar as medidas de antecipação de formatura; portanto, em tese, não há mais qualquer norma estatal que sustente os pedidos de redução do prazo de conclusão dos cursos superiores da área de saúde.


Acontece que, em recente decisão, o STF deferiu tutela de urgência em medida cautelar na 6625 e ampliou a aplicação da mais importante norma sobre medidas excepcionais para o período de pandemia, que também estava atrelada ao referido decreto de calamidade. Sobre o tema, decidiu o Tribunal Constitucional que:


“… embora a vigência da Lei n° 13.979/2020, de forma tecnicamente imperfeita, esteja vinculada àquela do Decreto Legislativo n° 6/2020, que decretou a calamidade pública para fins exclusivamente fiscais, repita-se, vencendo em 31 de dezembro de 2020, não se pode excluir, neste juízo precário e efêmero, próprio da presente fase processual, a conjectura segundo a qual a verdadeira intenção dos legisladores tenha sido a de manter as medidas profiláticas e terapêuticas extraordinárias, preconizadas naquele diploma normativo, pelo tempo necessário à superação da fase mais crítica da pandemia, mesmo porque à época de sua edição não lhes era dado antever a surpreendente persistência e letalidade da doença.
Tal fato, porém, segundo demonstram as evidências empíricas, ainda está longe de materializar-se. Pelo contrário, a insidiosa moléstia causada pelo novo coronavírus segue infectando e matando pessoas, em ritmo acelerado, especialmente as mais idosas, acometidas por comorbidades ou fisicamente debilitadas. Por isso, a prudência - amparada nos princípios da prevenção e da precaução, que devem reger as decisões em matéria de saúde pública - aconselha que as medidas excepcionais abrigadas na Lei n° 13.979/2020 continuem, por enquanto, a integrar o arsenal das autoridades sanitárias para combater a pandemia”.

Realmente, o uso do decreto de calamidade para limitar os efeitos das leis é tecnicamente imperfeito, até porque o decreto prevê que sua aplicação se dá “exclusivamente” no âmbito orçamentário. Em complemento, a razoabilidade da extensão da lei - que é o mais importante marco normativo para combate a pandemia, repita-se - também está bem detalhada, além de acrescida dos princípios da precaução e da prevenção. Por isso, a decisão do STF se mostra aparentemente correta.


Mas a questão aqui é outra: esta decisão se aplica a todas as normas que tratam do Decreto Legislativo nº 6? A resposta está no próprio texto da decisão, que expressamente se remete ao Art. 8º, da Lei 13.979/2020 sem tratar de qualquer efeito quanto a outras normas legais. Por ser específica, esta decisão do STF não se aplica, por exemplo, a norma educacional mencionada acima.


Contudo, se algum estudante ou entidade buscar uma “interpretação conforme” - técnica aplicada pelo STF na decisão acima - para a Lei 14.040/2020 provavelmente conseguirá. Esta seria uma decisão fácil, com uso de analogia para aplicar um entendimento já manifestado a uma situação que parece semelhante.


Mas seriam as situações realmente semelhantes? Agora a resposta pode ser mais difícil.

Na Lei 13.979/2020 as regras são necessárias para combater diretamente a pandemia. A possibilidade de aplicação de multas, de impor isolamento ou quarentena, de determinar o uso de máscaras são medidas indispensáveis para combater a pandemia. Na Lei 14.040/2020, a medida de antecipação de formatura tinha como base aumentar a oferta de profissionais para combater a COVID-19 (apesar de ser difícil, nesse sentido, justificar a inclusão do curso de odontologia).


Nosso entendimento é que o aumento da oferta de profissionais pode - ou deve - ser temporário e pode cessar antes do fim da pandemia, ao contrário das demais medidas, que não podem ser deixadas de lado enquanto durar a crise sanitária. Além disso, cabe lembrar, antecipar a formatura coloca no mercado profissionais que ainda não completaram sua formação, o que é um problema que deve ser considerado nesta comparação entre as excepcionalidades adotadas em 2020.


Enfim, o STF não prorrogou a possibilidade de formatura antecipada na área de saúde, mas qualquer juiz poderia faze-lo a partir da decisão da Suprema Corte, o que, em termos concretos, seria um erro.

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