Ensino superior e educação básica conectados contra a desinformação
- Ana Luiza Santos e Edgar Jacobs
- 3 de jul.
- 5 min de leitura
Em nossa publicação de hoje repercutimos parte do estudo intitulado “A necessária aliança entre Ciência e Educação”, publicado pela Academia Brasileira de Ciências. O trecho escolhido trata da importante questão de se criar uma integração entre universidades e escolas na busca de desenvolvimento de projetos voltados ao aprendizado de conhecimentos científicos. A finalidade é enfrentar a desinformação, o negacionismo e a pseudociência.
O ponto de partida do trabalho é o porquê de a população precisar conhecer a Ciência. De acordo com o estudo, somente conseguiremos discutir e analisar questões como mudanças climáticas, energia renovável, doenças e saúde pública, avanços tecnológicos e seus impactos sociais quando a população conseguir se apropriar de como funciona o método científico. A complexidade mora aí.
É importante que sejam divulgados os resultados da pesquisa científica de maneira clara, precisa e relevante, mas, acima de tudo, é preciso que seja ensinado como funciona o método científico, quase sempre um desconhecido da população. Este tipo de conteúdo não foi inserido nos currículos do ensino de base e agora é preciso todo um trabalho que alcance especificamente cada público, adaptando-se os contextos e grupos sociais aos quais é destinado.
O déficit na educação
Por muito tempo, partiu-se do princípio de que o déficit de conhecimento na sociedade poderia ser coberto pela divulgação científica. Com isso, o conhecimento se tornaria acessível para todos, independentemente de sua origem socioeconômica ou nível de escolaridade.
Posteriomente, foi compreendido que havia desafios e dificuldades com esse modelo de déficit, pois era preciso levar em conta o contexto em que as pessoas estavam inseridas. Outros modelos de popularização da ciência surgiram, como o que relaciona conceitos científicos com situações do cotidiano das pessoas, tornando-os mais compreensíveis e relevantes.
O estudo infoma que, mais recentemente, foi apresentado o modelo do engajamento público, que busca integrar o envolvimento das pessoas em debates e decisões relacionados à Ciência e à Tecnologia, tornando-as participantes ativas do processo, mas o mais importante é saber que não existe apenas uma única forma de divulgar Ciência e “o mesmo se pode dizer sobre a educação científica, que tem feito esforços para ampliar o interesse dos alunos na Ciência”.
Divulgação e educação científicas se complementando
A divulgação científica e a educação científica podem se complementar. A divulgação científica, que se apresenta nas mídias, nas redes sociais e em outros espaços, pode ser levada para dentro de sala de aula.
Mas, nas escolas, principalmente, não basta apresentar resultados de pesquisa ou comunicar evidências. Isto não transforma a cultura científica dos alunos. É preciso desenvolver ações “que estimulem o pensamento crítico, a formulação de questões a partir de suas próprias realidades, e o desenvolvimento, por meio de métodos científicos, de soluções para problemas sociais do cotidiano dos próprios estudantes”.
O texto analisado mostra que países como Finlândia e Singapura cuidam da transversalidade e multidisciplinaridade das disciplinas para desenvolver competências globais voltadas para a educação científica.
Sobre os ambientes informais, programas de televisão e mídias sociais, são alternativas populares de divulgação científica. Mas são meios que também disseminam desinformação científica, pseudociência e outras anomalias que costumam causar confusão sobre o entendimento público da Ciência e tecnologia.
O material da Academia Brasileira de Ciências cita um estudo recente de como a própria mídia tradicional publicou desinformação sobre a pandemia de Covid-19. Ela teve um papel fundamental na circulação de artigos preliminares, sem a devida revisão de pares, tendendo a enfatizar mais a crise política do que a crise sanitária provocada pela pandemia, em detrimento das próprias evidências científicas.
Mas é importante saber dos números: embora a desinformação circule em massa em diferentes espaços digitais, já se concluiu, como no estudo desenvolvido por Luisa Massarani, no âmbito do INCT-CPCT, que a circulação de informações corretas sobre ciência é muito maior em quantidade do que o obscurantismo. E tudo isto desafiando as lógicas das plataformas digitais mediadas algoritmicamente.
Enfrentando a desinformação, o negacionismo e a pseudociência
Parte dos autores, segundo o texto sobre o qual refletimos, tende a considerar a desinformação como uma comunicação produzida intencionalmente. Porque o modelo de circulação de informação predominante nas plataformas é mediado algoritmicamente, baseado em um regime de visibilidade. Nele, temas polêmicos e controversos ganham mais atenção e, obviamente, geram mais lucro para quem os publica.
E mesmo os usuários bem-intencionados podem disseminar informações falsas ou controversas devido a uma confiança sem crítica na fonte da informação ou por genuína ignorância.
É curioso que as pessoas também estão dispostas a acreditar em informações que confirmam suas crenças pré-existentes, o que é um grande problema. Elas preferem acreditar em certos dados e pertencer a um grupo específico, o que reforçaria a ideia de que não se trata apenas de deficiência educacional, mas de escolha consciente pela informação falsa para fortalecer o pertencimento social.
É nesse sentido que as ações de educação científica, desde o ensino fundamental, combinadas com a divulgação científica e educação midiática, têm sido apresentadas como formas promissoras de contenção da desinformação.
Seria uma diretriz básica de atuação, bem como o aumento nos investimentos na formação de professores para o enfrentamento à desinformação científica em suas práticas profissionais cotidianas.
Afinal, não resolveríamos a questão trabalhando apenas com uma população já fora do ambiente escolar, majoritariamente adulta, sem crítica, sem habilidade de discernimento, sem interpretação textual.
Em verdade, a intenção é a aproximação entre o ensino superior – promovendo a Ciência - e a educação básica; uma junção primordial para enfrentar a desinformação nas escolas. Uma consequência ao longo do tempo é a melhoria dos espaços informais de educação científica.
Ecossistema integrado
Para o estudo em análise, a parte prática da tese é a criação de um ecossistema integrado em Ciência e Educação.
É preciso associar institucionalmente as políticas científicas e as políticas educacionais, buscando promover a colaboração contínua e integrada entre os ministérios responsáveis por essas áreas no Brasil — ou seja, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e o Ministério da Educação (MEC).
A percepção é a de que esta integração permitirá a sincronização de esforços, recursos e estratégias, o que colaborará com a pesquisa em educação e ajudará a alinhar as políticas educacionais.
O compartilhamento de conhecimentos e ações e o estabelecimento de estratégias conjuntas entre ensino médio e superior poderá, por certo, acelerar os ganhos na educação e reduzir a disparidade em relação a outros países.
Sugerimos, por fim, o acesso ao site da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e a leitura de suas várias publicações, além, claro, do material em comento, produzido por grupo de trabalho da ABC, coordenado pelo Acadêmico Roberto Lent.

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