A transmissão das aulas ao vivo para os estudantes que preferirem (ou precisarem) ficar em casa quando do retorno às aulas presenciais tem sido a opção de várias escolas. Aparentemente é uma boa maneira de se contornar os problemas trazidos pela reunião diária de alunos e professores no ambiente escolar. A aula pode acontecer no espaço físico da instituição para uma parte dos estudantes, enquanto os demais acompanham pela rede e os grupos vão se alternando de modo que todos possam ser atendidos adequadamente – e sem aglomeração. No caso das universidades, por exemplo, as atividades práticas poderão ser realizadas de maneira apropriada e todos os alunos terão o suporte presencial a seu tempo e modo.
E o que pensam os especialistas sobre o tema? Vale conhecer as reflexões trazidas pela Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela USP, Lilian Bacich, que faz uma excelente reflexão em seu texto Presente e distante: pesquisas que abordam a transmissão ao vivo de aulas presenciais, apresentando-nos uma breve revisão da literatura e as vantagens e desvantagens desse sistema híbrido.
Inicialmente, a professora especifica o termo HOT instruction,
“em que HOT significa Here or there (aqui ou lá) é um dos termos utilizados para se referir à uma abordagem em que parte dos estudantes acompanha remotamente, de sua casa ou de onde preferir, a aula que ocorre na sala de aula presencial em que o professor palestra (oferece instrução) para a porcentagem de estudantes que está presente face-to-face.” BACICH, Lilian. Presente e distante: pesquisas que abordam a transmissão de aulas presenciais. Inovação na educação. São Paulo, 21 de agosto de 2020. Disponível em: https://lilianbacich.com/2020/08/21/presente-e-distante-pesquisas-que-abordam-a-transmissao-de-aulas-presenciais/ .
Ela salienta que, embora pareça um sistema/modelo novo no ensino, surgido pós-pandemia, já é desenvolvido e estudado há um bom tempo, mas no ensino superior em cursos semipresenciais, que são aqueles cursos com opção prévia de estudo nos campi ou em casa. O que a preocupa, de certa forma, é que há poucos estudos sobre esse modelo na educação básica. E, quando relatados, tratam do ensino médio.
Em um dos materiais analisados por Liliam Bacich, que também atuou na equipe de gestão do Grupo de Experimentações em Ensino Híbrido, são apresentadas vantagens e desvantagens desse modelo. E ela assim as simplifica:
As vantagens da HOT instruction
Possibilidade de alunos que residem longe da instituição de ensino participar dos cursos (ou em alguma instituição específica).
Possibilidade de disciplinas eletivas ocorrerem em horários alternativos.
Maior liberdade de professores e estudantes para frequentarem o campus quando assim o preferirem.
Possibilidade de maior conforto estratégico para alunos que apresentam necessidades educacionais especiais.
Potencialidade de evitar a evasão de estudantes que não podem ou tenham muita dificuldade de chegar ao campus.
Possibilidade de envolver profissionais de outras instituições nas aulas e cursos, promovendo troca de ideias.
Em se tratando de Brasil, um país continental, de áreas de difícil acesso, especialmente na região norte, é fácil perceber as vantagens trazidas pela pesquisadora. Fazer com que a educação chegue a todos os municípios do país é um grande – e necessário - desafio.
E, claro, o maior benefício desse modelo hoje seria a possibilidade de, quando autorizado pelas autoridades de saúde, a escola retomar as atividades presenciais com maior segurança.
Os desafios e/ou dificuldades da HOT instruction
O professor tem que adaptar as aulas para o novo formato, pois atenderá a dois espaços diversos.
O professor precisa estar capacitado para mais essa função em sala (atender ao público remoto).
O docente não pode focar em apenas um ambiente; ele precisa atender às necessidades de dois grupos de estudantes. Um desgaste do profissional é previsto.
Pode haver impacto na aprendizagem para os que estão no modelo remoto.
Redução de aprendizagem também para quem está no presencial, já que a atenção do professor vai ser dividida entre o público presencial e o remoto.
Provável maior indisciplina entre os que estão presentes.
Sensação de exclusão pelos alunos em aulas remotas quando de eventuais quedas de internet.
Ponderações e necessidade de mais estudos
É importante frisar que, pelo menos no caso do texto em referência, a autora reforça que os dados obtidos nas pesquisas são relativos a estudantes adultos.
Ainda não temos análises suficientes dos entraves emocionais desse tipo de aula em crianças, que, a propósito, já vivem grandes frustrações nesse período de pandemia.
Também não há dados das vivências de seus professores, que podem ficar desiludidos ao não conseguir lidar da maneira como desejam frente a esses novos desafios.
Já existe, segundo o texto citado, relato de queda de resultados de aprendizagem nas avaliações dos alunos que estão no modelo remoto. Esses estudantes por vezes ficam desmotivados e dispersos, mesmo porque as aulas continuam bastante expositivas.
Leia:
Orientações
Questões técnicas sobre como devem ocorrer as aulas híbridas - presenciais e remotas ao mesmo tempo - indicam que o professor deve permanecer mais tempo em um ponto da sala, de onde tanto os alunos em sala quanto os alunos que estão em casa o possam acompanhar.
É preciso encontrar um lugar em que a câmera possa focar o professor sem prejudicar os alunos in loco. O áudio também merece atenção. Todos os alunos precisam ouvir o professor em tom adequado.
Lembrando que o ensino híbrido é bem mais que apenas uma separação entre encontros presenciais e encontros remotos. Para além da iminente necessidade de mudanças em razão da pandemia, o modelo abarca um conjunto mais rico de estratégias de aprendizagem.
Ele pode significar a mistura do método de ensino tradicional presencial com o ensino a distância, inclusive de forma síncrona, como devem funcionar – pelo menos inicialmente – inúmeras instituições de ensino quando as atividades presenciais forem retomadas. E também pode significar uma estratégia/sistema de aprendizagem em que a figura do estudante é ativa, engajada e central no processo de ensino, apto a se dedicar de forma autônoma a pesquisas e às propostas de seu tutor.
Enfim, os prós e os contras da transmissão de aulas ao vivo quando do retorno às aulas presenciais serão colocados na balança no momento necessário. Os esforços, com certeza, serão para avançar e não retroceder.
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