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ANPD publica enunciado sobre o tratamento de dados pessoais de crianças e adolescentes

Primeiramente, cumpre definir o que é o enunciado publicado pela ANPD no dia 24 de maio deste ano. Ele é uma espécie de instrumento deliberativo cuja finalidade é interpretar a legislação de proteção de dados pessoais, sendo um ato próprio da Autoridade Nacional de Proteção de Dados e que possui efeitos vinculativos à própria ANPD.


A edição e a publicação de enunciados é um dever geral do Poder Público para promover o aumento da segurança jurídica a respeito de entendimentos e interpretações de dispositivos legais, podendo ser equiparado à súmula, que, nos tribunais ou em uma de suas turmas, representa ou sintetiza um entendimento sobre questões que apresentem controvérsias na jurisprudência.


Eles não possuem o status de lei e não são de aplicação obrigatória. Sua natureza é de orientação e não impedem a atividade criadora em uma eventual decisão judicial, desde que devidamente motivada.


No caso do enunciado da ANPD, a intenção é estabelecer interpretação padronizada sobre a aplicação de hipóteses legais no tratamento de dados de crianças e adolescentes


Vale dizer que quando a Autoridade Nacional de Proteção de Dados publicou este Enunciado - que pretende uniformizar a interpretação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) quanto às hipóteses legais que autorizam o tratamento de dados de crianças e adolescentes – procedeu à sua primeira iniciativa relacionada à proteção deste público específico, fixando, para tanto, entendimento acerca das possibilidades interpretativas do artigo 14 da LGPD.


O art. 14 da LGPD


O artigo 14 da LGPD informa que o tratamento de dados pessoais de crianças e de adolescentes deverá ser realizado em seu melhor interesse, nos termos do artigo – que vamos esmiuçar - e da legislação pertinente.


O tratamento de dados pessoais de crianças deverá ser realizado com o consentimento específico e em destaque dado por pelo menos um dos pais ou pelo responsável legal. Neste caso, os controladores (onde as instituições de ensino se encaixam) deverão manter pública a informação sobre os tipos de dados coletados, a forma de sua utilização e os procedimentos para o exercício de vários direitos que são previstos no art. 18 da lei, dentre eles acesso aos dados, correção de dados incompletos, inexatos ou desatualizados e anonimização, bloqueio ou eliminação de dados desnecessários (§§1 º e 2º).


No § 3º do artigo 14 há a previsão de que poderão ser coletados dados pessoais de crianças sem o consentimento quando a coleta for necessária para contatar os pais ou o responsável legal, utilizados uma única vez e sem armazenamento, ou para sua proteção, e em nenhum caso poderão ser repassados a terceiro sem o consentimento.


De acordo com o § 4º, os controladores não deverão condicionar a participação das crianças e adolescentes em jogos, aplicações de internet ou outras atividades ao fornecimento de informações pessoais além das estritamente necessárias à atividade, devendo deve realizar todos os esforços razoáveis para verificar que o consentimento foi dado pelo responsável pela criança, consideradas as tecnologias disponíveis (§ 5º).


Por fim, o artigo 14 prevê, em seu § 6º, que as informações sobre o tratamento de dados deverão ser fornecidas de maneira simples, clara e acessível, consideradas as características físico-motoras, perceptivas, sensoriais, intelectuais e mentais do usuário, com uso de recursos audiovisuais quando adequado, de forma a proporcionar a informação necessária aos pais ou ao responsável legal e adequada ao entendimento da criança.


O enunciado


De acordo com o Enunciado da ANPD, o tratamento de dados pessoais de crianças e adolescentes pode ser realizado com base nas hipóteses legais previstas na LGPD, como nos casos:


  • de consentimento fornecido pelo titular;

  • de cumprimento de obrigação legal;

  • de proteção à vida; ou

  • de atendimento a interesse legítimo do controlador.


O melhor interesse da criança e do adolescente deve prevalecer em qualquer destas situações e isto exige avaliação cautelosa por parte do controlador, que pode ser uma instituição de ensino, por exemplo, a quem compete as decisões referentes ao tratamento de dados pessoais.


O Enunciado pretende destacar a soberania do melhor interesse da criança e do adolescente como critério fundamental para a avaliação de operações de tratamento de dados envolvendo esses titulares e ele foi fruto de participação social, após instrumento simplificado para coleta de sugestões da sociedade sobre o tema – pela Plataforma Participa + Brasil entre os dias 08 de setembro e 07 de outubro de 2022. Por meio da chamada Tomada de Subsídios foram recebidas 78 contribuições de 12 estados brasileiros e de diferentes setores da sociedade.


A propósito, o tema da proteção de dados pessoais de crianças e adolescentes vem sendo trabalhado pela Coordenação-Geral de Normatização, constando na Agenda Regulatória da Autoridade para os anos de 2023 e 2024.


A intenção é a elaboração de um Guia Orientativo sobre Legítimo Interesse, documento que trará orientações específicas para o tratamento de dados pessoais de crianças e adolescentes com base nessa hipótese legal, em conformidade com o princípio do melhor interesse. As instituições de ensino precisam estar atentas a estas normas, pois possuem em sua guarda uma grande quantidade de dados de crianças e adolescentes e é evidente que o tema é de ação regulatória considerada prioritária dentro da ANPD.


Enfim, o Enunciado CD/ANPD Nº 1, de 22 de maio de 2023, produzido pelo Conselho Diretor da ANPD, foi publicado nos seguintes termos:


"O tratamento de dados pessoais de crianças e adolescentes poderá ser realizado com base nas hipóteses legais previstas no art. 7º ou no art. 11 da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), desde que observado e prevalecente o seu melhor interesse, a ser avaliado no caso concreto, nos termos do art. 14 da Lei."

Vale lembrar que o art. 7 º da LGPD traz as hipóteses gerais dos requisitos para tratamento de dados pessoais e o art. 11 aborda o tratamento de dados pessoais sensíveis. Ou seja, é válido admitir qualquer base legal para o tratamento, considerando o caso concreto para cada atividade de tratamento e, em qualquer hipótese, o princípio do melhor interesse deverá ser observado.


Para finalizar, vamos ressaltar que a interpretação acolhida pela ANPD é a mesma constante do Enunciado No. 684 da IX Jornada de Direito Civil, publicado no ano passado:


“O art. 14 da Lei n. 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD) não exclui a aplicação das demais bases legais, se cabíveis, observado o melhor interesse da criança.”


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