Lei 15.124/25 veda a adoção de critérios discriminatórios na seleção para bolsas acadêmicas
- Ana Luiza Santos e Edgar Jacobs
- 8 de mai.
- 5 min de leitura
Ações Afirmativas são políticas tanto públicas quanto privadas, desenvolvidas com o propósito de promover a reparação e a superação de desigualdades sociais que estruturam a nossa sociedade. Desigualdades que historicamente impediram o acesso de alguns grupos à universidade, por exemplo, por vivenciarem constante discriminação em razão de específica raça, classe, regionalidade, deficiência, orientação sexual e gênero.
As primeiras lutas no país relativas às Ações Afirmativas foram fomentadas pelo Movimento Negro Brasileiro, que denunciou a ausência de pessoas negras no ensino público superior e ampliou a discussão sobre a necessidade de implementação de políticas de reservas de vagas para ingresso nas universidades e demais instituições federais de ensino. Se hoje existem as cotas destinadas para pessoas negras, indígenas e com deficiência, os louros são destas políticas públicas, que não são as únicas, a propósito. Elas fazem parte de um rol amplo de ações que pretendem o acesso de todos à universidade.
Ponto importante é que hoje nosso ordenamento jurídico abriga quatro tratados internacionais com status de emenda constitucional, ou seja, tratados internacionais com valor de normas constitucionais. Todos eles se referem a direitos relativos ao fortalecimento das identidades inferiorizadas historicamente e, consequentemente, todos encorajam a ampliação das Ações Afirmativas.
Para conhecimento, citamos quais são estes tratados: é a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo; o Tratado de Marraqueche, relativo à reprodução e a distribuição de obras, livros e textos em formato acessível a pessoas com deficiência visual; e a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e todas as Formas Correlatas de Intolerância.
Nosso país, portanto, tem um compromisso internacional com a promoção do princípio da isonomia, um dos arrimos fundamentais do Estado de Direito. E ele estabelece que todos são iguais perante a lei e devem ser tratados de forma equitativa, sem discriminação ou tratamento desigual, na medida de suas desigualdades.
Programa Federal de Ações Afirmativas (PFAA)
No âmbito do governo federal, especificamente, o Programa Federal de Ações Afirmativas (PFAA) tem o objetivo de promover direitos e a equiparação de oportunidades por meio dos projetos destinados às pessoas negras, quilombolas, indígenas, pessoas com deficiência e mulheres.
Em agosto do ano passado, já foi publicada uma lei que dispõe a respeito da prorrogação dos prazos de conclusão de cursos ou de programas para estudantes e pesquisadores da educação superior em virtude de parto, de nascimento de filho, de adoção ou de obtenção de guarda judicial para fins de adoção.
Esta lei também altera a Lei nº 13.536, de 15 de dezembro de 2017, para disciplinar a prorrogação dos prazos de vigência das bolsas de estudo concedidas por agências de fomento e autoriza que as instituições de educação superior assegurem a continuidade do atendimento educacional e efetue os devidos ajustes administrativos referentes a prazos de conclusão de cursos ou de programas para estudantes e pesquisadores da educação superior, em virtude de: parto, de nascimento de filho, de adoção ou de obtenção de guarda judicial para fins de adoção.
Nos termos do regulamento de cada instituição de ensino superior, para os casos citados acima, previstos no caput do artigo 2º da lei nº 14.925/24, serão prorrogados os seguintes prazos nos cursos ou nos programas de graduação e de pós-graduação:
de conclusão de disciplinas e respectivos trabalhos finais;
de entrega dos trabalhos finais de conclusão de curso;
das respectivas sessões de defesa;
de entrega de versões finais dos trabalhos e
de realização de publicações exigidas nos regulamentos das instituições de ensino.
Também nos casos de parto, de nascimento de filho, de adoção ou de obtenção de guarda judicial para fins de adoção, o estudante terá direito a prorrogação de, no mínimo, 180 (cento e oitenta) dias em cada prazo normalmente fixado.
A Lei 15.124/25
Agora, com a Lei 15.124/25, do mês de abril, estudantes e pesquisadores não podem mais ser prejudicados por serem mães ou pais ao concorrer a bolsas de estudo e pesquisa. A norma proíbe que fatores como gravidez, nascimento de filho, adoção ou guarda judicial sejam usados para negar, cancelar ou dificultar o acesso a bolsas acadêmicas.
Para os efeitos da mais recente lei, a negativa de concessão de bolsas ou a avaliação negativa atribuída ao proponente ou bolsista pelas razões mencionadas, constituem evidência de discriminação.
Considera-se também critério discriminatório a realização de perguntas de natureza pessoal sobre planejamento familiar nas entrevistas que integram os processos de seleção para concessão de bolsas de estudo e pesquisa, ou para sua renovação, realizados pelas instituições de educação superior e agências de fomento à pesquisa, salvo prévia manifestação do candidato.
O período de avaliação da produtividade científica dos proponentes, em caso de licença-maternidade, será estendido pelo prazo de dois anos e o agente que praticar o ato discriminatório descrito no art. 1º da lei ficará sujeito à instauração de procedimento administrativo, no âmbito da respectiva instituição, em consonância com as disposições legais pertinentes à sua categoria profissional.
Na prática, como mencionado, a ampliação de prazos expande políticas que já vinham sendo adotadas por algumas instituições, como o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que implantou a prorrogação de prazos para bolsistas em licença-maternidade e paternidade em 2024.
Desde então, as mães pesquisadoras têm extensão de dois anos no prazo de avaliação de sua produtividade científica.
A partir de agora, a mais recente medida se torna obrigatória e de âmbito nacional, inclusive para as instituições privadas que oferecem bolsas com recursos públicos e agências de fomento à pesquisa.
Mulheres são as mais prejudicadas
É importante lembrar que a prorrogação de prazos para conclusão de tarefas do mundo acadêmico em virtude de parto, nascimento de filiação ou obtenção de guarda judicial para fins de adoção, ou licença adoção serve a estudantes que se tornam mães ou pais que enfrentam barreiras na conciliação dos estudos e dos cuidados com os filhos.
Entre as principais dificuldades estão a busca por uma rede de apoio para que eles possam se dedicar às atividades da faculdade e o gerenciamento do tempo, que deve ser dividido entre as demandas acadêmicas e as necessidades das crianças.
Maternidades/paternidades sem apoio, no caso das(os) estudantes de graduação e pós-graduação, constroem situações de evasão e desistência dos cursos e das pesquisas e que a prorrogação do pagamento de bolsas é aspecto crucial que deve ser acompanhado.
No caso, a Lei 15.124/25 não faz distinção entre o gênero do beneficiário da prorrogação dos prazos, mas é nítida parte de um conjunto de medidas voltadas para o fortalecimento da proteção às mulheres, as mais impactadas de maneira negativa em relação à maternidade.
A aprovação de mais esta necessária política não discriminatória foi resultado de mobilizações e movimentos estudantis e acadêmicos, que denunciam há anos a exclusão silenciosa de mães e gestantes em processos seletivos.

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