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Ana Luiza Santos e Edgar Jacobs

As escolas públicas e privadas devem reabrir?

Atualizado: 28 de nov. de 2020

Estamos na reta final do ano letivo. Observando a chegada da segunda onda na Europa, parece-nos ideal a manutenção das aulas não presenciais para somente reabrirmos as portas das escolas em 2021, ainda respeitando, claro, todas as medidas de segurança determinadas pelas autoridades de saúde.

Não é o que pensa o dr. Rubens Cat, médico pediatra e professor associado da Universidade Federal do Paraná (UFPR). O atual chefe do Departamento de Pediatria do Hospital de Clínicas (HC-UFPR) tem feito uma grande campanha em prol do retorno das aulas presenciais ainda esse ano, após comparar estudos de países que reabriram as escolas precocemente com os que esperaram para proceder com a reabertura.

Para o pediatra, talvez essa seja uma das maiores preocupações atualmente em relação ao COVID 19; isso pensando não só nas crianças, mas também nos pais, educadores e também não só nas escolas particulares, mas principalmente em escolas públicas. Como resultado dos estudos, ele organizou as principais recomendações no formato de um e-book chamado "Retorno Seguro às Escolas", de livre distribuição e com o objetivo de orientar pais, alunos e escolas sobre medidas de segurança no retorno às aulas presenciais.


O doutor Rubens Cat faz questão de explicar que a dinâmica da pandemia COVID-19 no Brasil não é uniforme e que presenciamos realidades diferentes em cada cidade, de modo que não se espera uma abertura homogênea em todo o país. Para se pensar em reabrir as escolas, as cidades ainda precisam atingir critérios como:


  • curva descendente do número de casos;

  • pelo menos duas semanas em fase amarela da pandemia; e

  • índice R abaixo de 1.


Quais são os motivos pelos quais as escolas deveriam reabrir?


Curiosamente para muitos a resposta principal não é o retorno para aprendizado escolar e conhecimento em vários níveis, mas, sim, amenizar e começar a tratar a principal consequência da suspensão das aulas, que é a alteração da saúde mental e alimentar, principalmente dos mais vulneráveis.


Vamos nos lembrar que o fechamento das escolas ocorreu ainda em março e que, em todo o mundo, deixou em torno de 2 bilhões de crianças e adolescentes sem todas as atividades essenciais realizadas na escola, o que inclui o ensino, mas também a sociabilização, as atividades físicas e, principalmente, a alimentação de qualidade.


De acordo com os estudos apresentados pelo Dr. Rubens, o isolamento prolongado fez com que aproximadamente 40% das crianças estejam apresentando sinais e sintomas de ansiedade, depressão, angústia, pânico de morrer, regressão motora, ideações suicidas e absurdas agressões físicas e abusos sexuais.


Para o doutor Rubens Cat, nos poucos países onde não houve fechamento das escolas e também naqueles que as portas já foram reabertas não houve aumento do número de casos, demonstrando que a chance de uma criança contaminar outra ou contaminar um adulto é pequena.


O pediatra faz questão de ressaltar que escolas e creches não são amplificadoras da COVID-19, mas peças fundamentais para a recuperação da comunidade após os traumas causados por essa pandemia.


O que dizem as pesquisas científicas


Ainda não existem pesquisas consolidadas e irrefutáveis a respeito dos riscos reais da convivência escolar para alunos, professores e suas famílias, mas já se conhece que a paralisação das atividades escolares é danosa em especial para crianças que vivenciam o processo de alfabetização, isso a partir dos 5 anos de idade.


Também já foram produzidos artigos concluindo que as crianças não são transmissoras significativas da Covid-19 e que é possível reduzir drasticamente, com cuidados, a possibilidade de contágio no meio escolar.



Outros levantamentos revisados por pares foram feitos nos EUA, na Austrália e na China e demonstraram que pode haver menos chances de a criança contrair a doença na escola do que em casa e/ou nas atividades que já estão liberadas.


Inúmeros outros estudos pelo mundo ainda estão em andamento e são utilizados, por exemplo, pelo Ministério da Saúde da Suécia, que defende a política de não fechar as escolas durante a pandemia. O órgão publicou um informe comparativo sobre as taxas de infecção infantil no país, comparadas às da Finlândia, que fechou as escolas entre 18 de março e 13 de maio. Os autores do documento, após analisar os dados sanitários dos dois países, concluíram que o “fechamento de escolas não teve nenhum efeito positivo mensurável em relação ao número de casos de Covid-19 entre crianças”.


Como iniciamos nosso tópico – é bom frisar -, as pesquisas não são consolidadas e irrefutáveis a respeito dos riscos reais do retorno das aulas presenciais; um estudo realizado por um conjunto de pesquisadores da Universidade de Harvard, e publicado no The Journal of Pedriatrics, em agosto, concluiu que a carga viral em crianças, nos dois primeiros dias dos sintomas, poderia ser mais alta do que em adultos, ainda que os sintomas nos mais jovens sejam mais moderados.

Outros pesquisadores também estão cautelosos quanto à reabertura: o pediatra e professor da Universidade Leicester, Damian Roland, e o pesquisador na área de doenças infecciosas pediátricas, Alasdair Munro, no artigo Children and transmission of SARS-CoV-2″, depois de analisarem diferentes estudos científicos, concluíram que as crianças são menos suscetíveis a serem contaminadas pela Covid-19 do que os adultos com a mesma exposição, mas possuem quantidades altamente variáveis do vírus, semelhantes as dos adultos.


OMS, UNICEF e UNESCO


De qualquer forma, a última orientação da OMS, UNICEF e UNESCO sobre como e quando reabrir escolas com segurança, ocorrida no dia 14 de setembro, foi a de que é fundamental a continuidade da educação para a aprendizagem, desenvolvimento, bem-estar, saúde e segurança das crianças e que as escolas devem ser priorizadas entre as primeiras instituições a serem abertas à medida que as sociedades reabrem.


Os órgãos reforçaram as consequências devastadoras para crianças, jovens e sociedades como um todo por conta do fechamento das escolas, que deve ser considerado como um último recurso, de forma temporária e apenas em nível local; isso se o surto ainda não tiver sido manejado.


Não há risco zero, alertam, mas a reabertura das escolas juntamente com as medidas preventivas tomadas por toda a sociedade são extremamente vantajosas para todos.


Também frisam que crises anteriores – como o do Ebola, na África - já nos ensinaram bastante sobre como construir confiança e tranquilizar a família sobre a segurança das escolas. O que precisamos é de ampla mobilização social e engajamento dos líderes comunitários para que a vida possa voltar à normalidade.


Comunidade médica brasileira


Em setembro, um grupo de 29 médicos assinou uma representação direcionada ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) cobrando medidas para garantir o retorno das atividades presenciais nas instituições de ensino e teve apoio de infectologistas como Francisco Cardoso, assistente de UTI do Hospital Emílio Ribas. O médico defende que, como há menores índices de transmissão do vírus em crianças, há um risco menor na volta às atividades escolares presenciais se comparado ao retorno ao trabalho, por parte de adultos, ou à abertura de comércios e da indústria.


E o que a comunidade médica brasileira – em especial a pediátrica – deseja é que, ao fim e ao cabo, escolas públicas tenham as mesmas condições de segurança e ensino das privadas, para que possamos pelo menos conter o aumento da desigualdade que a pandemia escancarou.


Se todas as escolas – devidamente autorizadas após cumpridos os critérios necessários - adotarem as medidas de precaução e higiene determinadas pelos órgãos de saúde, sendo devidamente vistoriadas pelas entidades públicas de controle, o retorno pode ser de sucesso e conseguiremos amenizar um pouco os danos causados pela então necessária suspensão das aulas presenciais. As prioridades, enfim, precisam ser repensadas.





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