O Conselho Regional de Psicologia do Distrito Federal (CRP 01/DF) redigiu uma série de orientações a seus colaboradores e buscou fornecer informações e reflexões essenciais para ajudar o trabalho daqueles que, em sua prática profissional e de cuidado, lidam com temas tão delicados como o do suicídio e da automutilação.
O documento não é direcionado apenas a profissionais de Psicologia e outros profissionais da saúde, portanto, mas também aos profissionais da Educação, a quem indicam a necessidade de ter um contato qualificado, ainda que introdutório, a temas que, mesmo com algum espaço na mídia e no debate público, ainda são desconhecidos e fontes importantes de insegurança.
As autoras das orientações entendem que não há como esgotar os temas, reconhecendo, apontando e advertindo para a natureza extremamente complexa, multidimensional e desafiante de comportamentos cuja sombra estão associados a uma enorme carga de vulnerabilidade, estigma e dor. De se ressaltar que, historicamente, “ o suicídio e a automutilação representam importantes desafios conceituais e práticos para profissionais e estudiosos de campos como a medicina, a filosofia, a psicologia, a psiquiatria, a educação, a antropologia e a sociologia ”.
O papel das escolas
De acordo com a publicação do Conselho Regional de Psicologia do Distrito Federal, uma parcela considerável das tentativas de suicídio são de pessoas na faixa etária escolar. Dessa forma, é muito importante que todo o corpo docente esteja preparado para identificar sinais nos adolescentes (e até em crianças). E a escola, afinal de contas, além de ser um espaço de socialização e aprendizagem, deve ser também fonte de promoção de saúde e cuidado.
Hoje já se sabe que o bullying é um dos principais fatores associados ao risco de suicídio nessa faixa-etária. As vítimas podem ficar em estado constante de pressão psicológica, com efeitos na autoestima que podem perdurar até a idade adulta.
Combater o bullying e outras violências, promover discussões sobre as dificuldades emocionais e como enfrentá-las são, pois, também responsabilidade das escolas, que podem promover programas de desenvolvimento de habilidades socioemocionais, fortalecendo a parte emocional na infância e adolescência.
Essas medidas são muito eficazes para a prevenção do comportamento suicida na juventude e na vida adulta. Outras estratégias preventivas envolvem o desenvolvimento de um ambiente emocionalmente seguro no contexto escolar, com a existência de espaços para o protagonismo juvenil e para expressão dos sentimentos.
Treinar os profissionais que atuam na escola também é de grande importância, pois, como alerta o próprio documento do CRP 01/DF, o Setembro Amarelo, por exemplo, costuma ser abordado nas escolas com decoração nas cores da campanha, palestras e outras ações, estratégia não recomendada com o público adolescente e que pode ter efeitos contrários.
Não estão indicadas atividades que tratem diretamente do tema suicídio, como redações, palestras, atividades extracurriculares etc. Entretanto, é importante haver preparo para lidar com o assunto caso surja entre estudantes. A capacitação de profissionais que atuam na escola deve considerar o desenvolvimento de habilidades de escuta empática, o acolhimento das demandas emocionais de estudantes e identificação precoce de estudantes em risco.
Tema importante que deve ser discutido entre os profissionais da Psicologia dentro da escola - e levados para todos os docentes - são os efeitos da publicização do suicídio de celebridades. De acordo com o estudo que se analisa, eles têm implicações para a saúde mental similares ao enlutamento por suicídio, especialmente entre adolescentes. Assim, quando um caso de relevo é noticiado pela mídia, talvez seja um bom momento para a acolhida e escuta dos alunos, em especial daqueles mais consternados.
Epidemiologia: identidades, comportamentos e situações que aumentam os casos
As escolas devem ter acesso aos dados relativos às identidades, comportamentos e situações que aumentam os casos de suicídios e avaliá-los frente a seu público de crianças e adolescentes. Esse olhar próximo e – porque não – também solidário, pode salvar um estudante.
Curiosamente, ao lado das pessoas idosas, adolescentes estão em grande número nas estatísticas de pessoas que cometem ou tentam o suicídio. Também está a população LGBTQIA+, a população negra, a indígena e a de mais baixa escolaridade. Tentativas de suicídio anteriores, transtornos mentais, sofrimento psíquico prévio, consumo abusivo de drogas são fatores agravantes, sem contar o desemprego e a precarização das relações de trabalho. O relatório do Conselho de Psicologia também menciona índices altos entre os profissionais de segurança e no decorrer das fases mais complicadas da pandemia de Covid-19
O papel dos serviços e equipamentos para o cuidado
Os principais serviços e equipamentos de atenção e cuidado da pessoa com comportamentos suicidas, desde serviços para o momento de crise, passando por acompanhamento especializado, até os serviços que atuam na prevenção ao suicídio e na promoção à saúde mental a partir de uma compreensão mais ampla precisam ser conhecidos pelos profissionais da Educação.
Hoje existem, em regra, nos municípios, serviços dos:
hospitais gerais e unidades de pronto atendimento;
serviços de socorro e atenção pré-hospitalar: SAMU, Bombeiros, PM;
serviço telefônico 24h: CVV;
centro de atenção psicossocial (CAPS)
clínicas-escola;
unidades básicas de saúde: (UBS);
consultórios particulares;
núcleos ampliados de saúde da família (NASFS)
serviços do SUAS (sistema único de assistência social)
Experiência exitosa em escola pública
No Distrito Federal, uma experiência realizada na escola pública Gesner Teixeira demonstra como é viável articular os setores da educação e da saúde. A partir da identificação da existência de muitos casos, entre estudantes, de automutilação e ideação suicida, a escola implementou rodas de terapia comunitária e outras práticas integrativas em saúde, tais como reiki, automassagem e meditação no próprio ambiente escolar.
Os estudantes participam das atividades e contribuem com a gestão e oferta das mesmas, criando redes de apoio mútuo e cuidado compartilhado. A partir de um certo tempo, as atividades proporcionaram melhora no desempenho escolar, a interrupção dos comportamentos de automutilação e ideações suicidas, contribuindo também para uma melhoria no convívio social.
Garantia de direitos e políticas sociais: o SUS, a SUAS e a Educação
O Conselho de Psicologia do Distrito Federal dispõe que, para garantir saúde mental e prevenir o suicídio, é fundamental que os direitos sociais sejam garantidos. Consta no art. 6º da Constituição Federal que são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados. Esses direitos são efetivados pelas políticas sociais.
Na educação, estão todas as crianças e adolescentes. O SUAS tem seus serviços presentes em todo o Brasil com o objetivo de garantir proteção social e os direitos relativos a renda, moradia, vínculos familiares, deficiência, violência. No Sistema Único de Saúde (SUS), o maior sistema universal de saúde do mundo, fazem-se presentes os princípios da integralidade, da universalidade e da equidade. O Conselho aposta em políticas públicas fortes de educação, assistência social e saúde para garantir saúde mental a cada uma e cada um.
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