Há poucas semanas publicamos que, ao contrário da percepção de que há excesso de cursos de Medicina no Brasil, os números indicam que a demanda pela formação médica continua alta. E que o elevado custo das mensalidades e a significativa migração de estudantes brasileiros para cursos no exterior são os indícios claros de que ainda há espaço para a ampliação deste ensino, desde que feito com qualidade.
Os altos custos das mensalidades e a oferta limitada de vagas dificultam o acesso à formação e incentivam a migração de estudantes para o exterior. Em 2018, o Ministério das Relações Exteriores fez uma estimativa de mais de 65 mil brasileiros estudando Medicina na Argentina, Paraguai e Bolívia, número que representa mais de um terço dos estudantes de Medicina registrados no último Censo da Educação Superior.
Entre 2015 e 2022 o número de brasileiros frequentando as faculdades argentinas, por exemplo, quintuplicou – passou de 4.000 para 20.000 estudantes -, números sentidos no Revalida, que apresentou aumento de 10 mil para cerca de 17 mil inscritos entre 2024 e 2025.
Mais informações a este respeito podem ser acessadas em nosso texto 65 mil brasileiros estudam medicina fora, e AGU admite: 95% das regiões de saúde têm média insuficiente de médicos, que também cuida da questão da regulação dos cursos no país.
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Impostos
O que pouco se fala, além da migração de estudantes brasileiros para Argentina, Paraguai, Bolívia e até Rússia, para concretizar o sonho de cursar Medicina, é que esse movimento gera um impacto negativo ao país.
De acordo com estimativas da AMIES - Associação dos Mantenedores Independentes Educadores do Ensino Superior - , o Brasil deixa de arrecadar pelo menos R$ 6 bilhões por ano com a evasão dos estudantes.
Calcula-se este montante com base no valor médio de um curso de Medicina ao longo dos seis anos da graduação, além de impostos e taxas. Também são contabilizadas as bolsas de estudos, descontos concedidos a estudantes de baixa renda e o aumento das vagas nos últimos anos.
Como já mencionado, o Ministério das Relações Exteriores estima cerca de 65 mil brasileiros estudando Medicina nos três países citados da América Latina; o número de alunos no Paraguai é tão grande que o MRE disponibiliza em seu sítio eletrônico as Instituições Habilitadas e Acreditadas de Ensino Superior.
“Tendo com conta o alto interesse de consulentes brasileiros em cursar seu ensino superior no Paraguai, em particular carreiras de Medicina, o Consulado-Geral do Brasil em Ciudad del Este recomenda consulta aos sítios eletrônicos das autoridades educacionais paraguaias antes da escolha de uma universidade para matrícula, a fim de se verificar seu credenciamento e habilitação.
O Paraguai conta, em março de 2025, com 43 faculdades de Medicina habilitadas pelo "Consejo Nacional de Educación Superior" (CONES), porém apenas 23 já estão acreditadas pela Agencia Nacional de Evaluación y Acreditación de la Educación Superior (ANEAES).” (Site do MRE)
De fato, o valor das mensalidades praticados no Brasil pode ser um fator que empurra os candidatos para fora do país, mas a enorme concorrência por vagas é, definitivamente, a causa maior da migração.
Em entrevista para a Contadores.cnt.br, Nésio Fernandes, médico formado em Cuba e ex-Secretário de Atenção Básica no Ministério da Saúde, afirma que a expansão na oferta de cursos e vagas de Medicina em países da América Latina tornou-se um mercado. Ele menciona a existência de empresas brasileiras especializadas em levar estudantes para cursar medicina em países da região, principalmente no Paraguai e na Bolívia.
A principal diferença para os estudantes, além dos valores das mensalidades, estaria na forma de ingresso na faculdade. Na Argentina e no Paraguai não existe um vestibular como o brasileiro, mas um curso preparatório na própria instituição. Algumas delas possuem, inclusive, critério de admissão por ordem de chegada.
Lembrando que esta prática, além de causar impacto bilionário ao Brasil, traz alguns inconvenientes aos estudantes, que precisam ser aprovados no Revalida para poder exercer a profissão no país.
O Revalida e a necessidade de mais vagas
A prova, que possui altos índices de reprovação, é uma avaliação que verifica se o candidato possui habilidades, competências e conhecimentos requeridos para o exercício profissional adequado aos princípios e necessidades do Sistema Único de Saúde (SUS), em nível equivalente ao exigido dos médicos formados no Brasil.
No exame de 2022, a taxa de aprovação foi somente de 3,75%, a menor em toda a história do exame. Aproximadamente 96% dos candidatos foram reprovados na primeira ou na segunda etapa, ou seja, não puderam exercer a profissão até a próxima prova. Na edição de 2023, cerca de 10% dos candidatos foram aprovados; a prova teórica mais recente com dados disponíveis, a da edição de 2024, contemplou positivamente 15,48% de aprovados.
O Brasil possui hoje 379 cursos de Medicina em funcionamento; são 121 cursos em universidades públicas e 268 em universidades privadas. São 41.805 vagas em Medicina disponíveis, sendo 9.725 no ensino público e 32.080 no ensino privado. Existem, no entanto, quase 190 pedidos em tramitação no Ministério da Educação para abertura de novos cursos, 110 pedidos para abertura de mais vagas em cursos já existentes, além de inúmeros processos judiciais em curso para autorizações de cursos – um ´típico caso de litígio estrutural decorrente da desfuncionalidade das instituições envolvidas no processo regulatório'.
A Medicina
A Medicina nunca deixou de ser uma carreira concorrida e o sonho de muitos jovens. O ofício possui uma grande variedade de especialidades e seu profissional goza de prestígio, status e destaque. Sua importância e necessidade é percebida nos números: de acordo com a pesquisa que mencionamos, o curso de maior empregabilidade no país é justamente o de Medicina, com 92% dos profissionais entrevistados empregados.
A trajetória universitária é um objetivo aspirado por muitos brasileiros e a demanda pela formação médica é tão alta que hoje presenciamos migração de estudantes brasileiros para cursos médicos no exterior, o que importa na perda de R$ 6 bilhões de impostos por ano para o país.
Junte-se a isso um cenário de falta e a má distribuição de médicos pelo país, pelo que reforçamos a necessidade do novo Ministro da Saúde fomentar a lei que assinou há anos: a Lei do Programa Mais Médicos.
O programa foi um marco para a saúde do país e nasceu para ser uma política de indução, não de contenção da expansão de cursos e vagas de Medicina, como tem ocorrido nos últimos tempos. Precisamos avançar na saúde pública, o que significa restabelecer a carência de médicos, com todas as repercussões que lhes dizem respeito.
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