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Para STJ, morte de aluno em estacionamento não é responsabilidade da instituição de ensino

 Uma ação indenizatória ajuizada pelos pais de um graduando da engenharia civil, morto a tiros no estacionamento de uma  instituição de ensino superior, chegou até o Superior Tribunal de Justiça.


De acordo com o processo, já era noite, por volta das 21 horas, quando dois homens não identificados como alunos da universidade adentraram o campus em uma moto e efetuaram três disparos de fogo contra o estudante, que, infelizmente, faleceu no local. O aluno, vítima de verdadeiro ato de execução, estava no intervalo da aula no momento do crime.


Os autores da ação alegaram que a faculdade ‘falhou na prestação do serviço’ por não ter adotado medidas de segurança adequadas para proteger seus alunos e controlar o acesso de pessoas estranhas. Destacaram que o estacionamento era vulnerável, pois não havia vigilância, controle de entrada ou ronda de segurança.


Os pais pleitearam, então, indenização por danos morais pela perda do filho de 22 anos e danos materiais, no valor de R$ 325 mil, referentes ao pensionamento que o jovem prestava e ainda prestaria à família ao trabalhar em sua propriedade rural.


Eles também requereram indenização por danos morais no valor de  R$ 528 mil, em razão de omissão e descuido da instituição quanto à segurança de seus alunos.


Em primeira instância o pedido da família foi julgado procedente, mas, em resposta aos recursos impetrados, a decisão foi finalmente reformada, decidindo a 3ª turma do STJ, por maioria, que o crime foi fato de terceiro imprevisível, o que afasta totalmente a responsabilidade da instituição de ensino.

 

Responsabilidade civil


A responsabilidade civil é um conjunto de regras que regula o dever de indenizar. Responder civilmente, por conseguinte, é ser condenado a pagar indenização. Em regra, fala-se  em responsabilidade civil quando há prática de um ilícito civil, e as exceções só prosperam quando existe lei específica. Afinal, cobra-se  responsabilidade de alguém quando este viola uma obrigação jurídica, que pode decorrer de lei ou de outro fato jurídico.


Em relação à culpa, a responsabilidade pode ser subjetiva ou objetiva. A responsabilidade subjetiva depende da prova de culpa do agente e é a regra geral: sem culpa, não há responsabilidade (art. 927, CC). Culpa é tomada em sentido amplo e abrange a culpa em sentido estrito (negligência, imprudência e imperícia) e o dolo (intenção deliberada de causar o dano).


Já a responsabilidade objetiva dispensa a prova de culpa. É exceção e, portanto, depende de lei.


Voltando à responsabilidade subjetiva, regra em nosso país, os pressupostos para sua configuração são a conduta (inclusive omissiva), a culpa, o nexo causal e o dano. Sem esses pressupostos, não há responsabilidade civil.


A responsabilidade também pode ser classificada como direta ou indireta. Direta é aquela por ato próprio, que é quando o agente é responsabilizado por uma conduta que ele mesmo adotou. A indireta, por sua vez, ocorre quando alguém responde por um dano causado por conduta de um terceiro, por uma coisa ou animal. Este tipo de responsabilidade (indireta) é uma exceção em nosso ordenamento e também só é admitida quando houver lei expressa.


Principais causas que excluem a responsabilidade


As principais causas excludentes de responsabilidade civil são o caso fortuito ou força maior, a culpa exclusiva da vítima, o fato de terceiro e, em alguns casos, a legítima defesa, o estado de necessidade, o estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular de direito. Essas situações desconfiguram o nexo de causalidade ou a culpa, eliminando a obrigação de indenização. O que ocorreu no caso do falecimento no estacionamento da faculdade?


A 3ª turma do STJ


Em relação ao lamentável episódio ocorrido no campus da instituição de ensino, a maioria do colegiado entendeu que o evento, um crime de execução, foi um fato de terceiro, imprevisível e alheio à atividade educacional, o que caracterizou um caso fortuito externo que rompeu o nexo causal entre o dano e a conduta da instituição.


A decisão não foi unânime. Ficaram vencidas as ministras Nancy Andrighi e Daniela Teixeira, que entenderam pelo reconhecimento da responsabilidade da instituição de ensino.


O ministro relator, todavia, fez uma excelente análise do caso. Ele verificou os limites da responsabilidade objetiva de instituições de ensino superior por danos ocorridos em seus estacionamentos.  Destacou que a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços, prevista no art. 14 do CDC, pode ser afastada quando há ato exclusivo de terceiro, o que rompe o nexo causal.


O relator justificou que, de acordo com a teoria do risco-proveito e a Súmula 130 do Superior Tribunal de Justiça, o fornecedor responde pelos riscos inerentes à sua atividade econômica, inclusive quanto à segurança do consumidor, mas apenas quando o dano decorre de fortuito interno.


Na hipótese, o ministro entendeu que o homicídio foi um fortuito externo, pois tratou-se de evento absolutamente imprevisível e alheio ao risco da atividade educacional. Inclusive porque o estacionamento não possuía controle de acesso nem estrutura de segurança que criasse expectativa legítima de proteção aos frequentadores.


Dessa maneira, afastou-se a responsabilidade da instituição de ensino, firmando-se o entendimento de que não houve falha na prestação do serviço. Ao final, o recurso foi provido para reverter a condenação da universidade ao pagamento de indenização.


Realmente, contrariamente ao entendimento das ministras vencidas, houve um caso fortuito externo, que não poderia ser impedido pela instituição de ensino, e que exclui qualquer forma de responsabilidade que poderia ser suscitada.

 

Jurisprudência análoga: assalto a transporte público


A jurisprudência já vem considerando que o assalto genericamente falando, ou seja, o roubo ou furto, em transporte coletivo rodoviário de pessoas, é um fortuito externo, já que diz respeito a uma questão de segurança pública que não é inerente à atividade do transportador rodoviário. Além de tal risco não estar refletido no preço das tarifas cobradas, o consumidor não possui a legítima expectativa de que o veículo terá seguranças armados ou portas detectoras de metais para impedir a ação de assaltantes. Não importa, portanto, se o local do transporte é habitualmente testemunha de assaltos, pois esse risco não é inerente à atividade do transportador.


Nesta hipótese específica, a concessionária de serviço público de transporte não responde por assaltos ocorridos no interior de seus veículos. Apenas no caso de ser provada alguma culpa do transportador pelo assalto ocorrido é que se excluirá a ideia do caso fortuito e, portanto, será devida a responsabilização do transportador.


A decisão citada, conteúdo de um voto proferido pela Ministra Nancy Andrighi, relatora do REsp 1136885/SP, trata de caso que se assemelha ao que ocorreu no estacionamento da instituição de ensino. Não havia nenhuma previsibilidade em relação aos terceiros que invadiram o campus e efetuaram os disparos contra o estudante. O evento saiu totalmente da esfera de poder da instituição de ensino e, claro, dos prepostos que pudessem estar presentes na ocasião.


O evento tratou-se de um grave problema de segurança pública e não havia qualquer cabimento transferir a responsabilidade pelo seu acontecimento ao fornecedor de serviços educacionais, que, vale ressaltar, teve seus funcionários e outros estudantes também postos em perigo.


A decisão, enfim, reforça a jurisprudência já pacífica a respeito do tema. 

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