CFM publica mais regras para o exercício profissional da docência médica
- Ana Luiza Santos e Edgar Jacobs
- há 3 dias
- 5 min de leitura
Atualizado: há 1 dia
Os Conselhos Profissionais foram criados a partir da década de 1950, frutos do processo de regulamentação das profissões no Brasil: o Conselho Federal de Economia e o Conselho Federal de Medicina, por exemplo, foram criados em 1951. Em 1964, tivemos a criação do Conselho Federal de Odontologia.
Na Constituição de 1988, foi estipulado o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer, competindo privativamente à União legislar sobre a organização do sistema nacional do emprego e condições para o exercício das profissões.
É da alçada dos conselhos de fiscalização de atividade profissional, sempre mediante leis específicas, orientar, supervisionar, fiscalizar e disciplinar o exercício da profissão. Zelar pelo prestígio e bom nome dos profissionais que a exercem, bem como organizar e manter o registro profissional, o que inclui a inscrição e seu eventual cancelamento.
As finalidades dos conselhos também são várias. As principais incluem examinar reclamações e representações; representar às autoridades competentes; atuar como órgão de consulta do Governo; atuar em colaboração com entidades de classe e escolas e faculdades; contribuir para o desenvolvimento econômico; e disseminar a técnica econômica nos diversos setores da economia nacional, promovendo estudos e campanhas em prol da racionalização econômica do país.
Para ler mais sobre a história dos Conselhos de Fiscalização de Profissões regulamentadas, acesse nosso texto.
Pois bem, não obstante as competências diversificadas dos Conselhos Profissionais, nos últimos tempos temos presenciado uma atividade anômala destes órgãos.
Em algumas oportunidades escrevemos a respeito. Houve a ocasião, por exemplo, em que o Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul publicou uma Resolução que veda ao médico exercer a docência de disciplina especificamente médica em Curso de Graduação em medicina ou Residência Médica em faculdade que:
não tenha autorização de funcionamento concedida pelo Ministério da Educação ou concedido por ordem judicial;
não possua condições mínimas para o ensino médico, nos termos definidos pelo Ministério da Educação e critérios exigidos pelos Conselho Federal ou Regional de Medicina para a fiscalização do ensino médico.
À época elucidamos que a Resolução do CREMERS estipulava condições mínimas para o ensino médico, que até poderiam não ser desprovidas de sentido, mas encontravam barreiras no fato de que o Órgão não tinha competência para tanto.
E agora, no início de julho de 2025, o Conselho Federal de Medicina exarou uma Resolução estabelecendo a responsabilidade técnica e ética dos coordenadores dos cursos de medicina quanto aos campos de estágio, incluindo-se o internato ou em quaisquer outras atividades que envolvam interações entre graduandos de medicina, preceptores ou professores e médicos com pacientes e/ou familiares.
A norma também institui um cadastro único de coordenadores de curso para “facilitar a fiscalização da infraestrutura necessária ao aprendizado” (sic).
Ora, é fato que a Lei 12.842/2013, que dispõe sobre o exercício da medicina, determina ser privativo de médico a coordenação dos cursos de graduação em medicina, dos programas de residência médica e dos cursos de pós-graduação específicos para médicos.
A questão é que a atuação do profissional médico como docente não é regulada pelo Conselho de Classe.
Nesse sentido, inclusive, o Decreto 9.235/2017 prevê que o exercício de atividade docente na educação superior não se sujeita à inscrição do professor em órgão de regulamentação profissional (Art. 93), já demonstrando o desacordo da regra da Resolução de que coordenador de curso de graduação em medicina deve ser profissional médico legalmente habilitado, com registro ativo e regular no CRM da jurisdição onde atua.
Da mesma forma, a Resolução do CFM exige que, no caso da existência de vice-coordenador, coordenadores de internato, coordenadores de campo de estágios locais ou similares, esses deverão ser médicos com registro ativo no CRM da jurisdição, além de ser dever do coordenador de curso garantir que todos os professores e/ou preceptores tenham inscrição no CRM da jurisdição do campo de estágio.
Basta, enfim, uma breve análise da Resolução CFM nº 2.434, de 03 de julho de 2025, para verificarmos o quanto o Conselho Federal se imiscui nas atividades das Instituições de Ensino Superior.
O registro dos coordenadores é um bom exemplo. O art. 10 da Resolução do Conselho Federal determina ser dever da IES informar ao Conselho Regional respectivo a identidade do médico designado como coordenador de curso de graduação em medicina, para cada um dos seus campi que ofereçam o curso, com a data de início de suas atribuições no cargo, assim como seu desligamento ou substituição.
As IES têm o dever de notificar o CRM, tempestivamente e em prazo máximo de 15 dias, por meio de ofício, sobre a designação de um novo coordenador do curso de medicina ou sobre a cessação das funções do coordenador anterior.
Coordenador ou fiscal?
Uma questão importante a ser debatida é que a Resolução do CFM impõe ao coordenador de curso a função de “guardião” dos atos dos demais profissionais da instituição.
Art. 4º§ 3º O coordenador de curso em campos de estágio deve ser o guardião e fiscalizar os atos próprios dos médicos, seus aspectos jurídicos, sua responsabilidade e autonomia e os limites inerentes a essas atribuições, de acordo com as normas éticas pertinentes editadas pelo CFM.
É seu dever comunicar ao CRM quaisquer irregularidades, infrações éticas ou eventos adversos graves observados nos campos de estágio que envolvam estudantes, professores ou preceptores; monitorar continuamente a adequação das condições de infraestrutura e dos recursos humanos dos campos de estágio à formação médica proposta no PPC; notificar imediatamente o CRM, em prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas, sobre qualquer alteração nas condições dos campos de estágio que possa comprometer a qualidade da formação médica, a segurança do paciente ou que resulte em descumprimento do PPC, além de garantir que todos os professores e/ou preceptores tenham inscrição no CRM da jurisdição do campo de estágio, o que nem é exigido pelo Decreto 9.235/2017, como já mencionado.
Ora, esta norma cria uma condição constrangedora na qual coordenadores e docentes de cursos tornam-se fiscais do Conselho, gerando um clima ruim no ambiente de ensino e aprendizagem.
A regra, frise-se, atribui aos coordenadores responsabilidades que, se existirem, devem ser assumidas por representantes dos órgãos de classe, que não podem delegar sua atuação fiscalizatória.
E a Resolução ainda prevê, caso não sejam atendidas suas disposições, a decretação de uma “interdição ética” dos campos de estágio.
Enfim, o MEC, em sua atuação ao longo das décadas, instituiu sucessivas normas que regulamentam o ensino e estabelecem padrões de funcionamento das IES, o que influencia a sua definição curricular e, conseqüentemente, as suas formas de conduzir os cursos ofertados, incluindo as atribuições, os encargos e as responsabilidades do Coordenador, que já são inúmeras – políticas, gerenciais acadêmicas e institucionais. Não cabe aos Conselhos a ingerência dentro da organização das IES, gerando novas competências aos docentes.
A Resolução foi publicada no Diário Oficial da União em 01 de agosto de 2025 e entrará em vigor em 60 dias a contar desta data.

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