top of page

Vedação do EaD em determinados cursos afeta estudantes mais vulneráveis

A vedação explícita do EaD em determinados cursos é um ponto controverso da Nova Política de Educação a Distância. Medicina, direito, odontologia, enfermagem, psicologia e demais cursos da área da saúde e licenciaturas não poderão ser ofertados a distância; apenas nos formatos presencial e, alguns, apenas no semipresencial.


Quais  as consequências da proibição para a educação brasileira?


Pois bem, quando do ajuizamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade -  (ADI) 7845 - uma informação interessante foi trazida pela Associação Brasileira dos Estudantes de Educação a Distância (ABE-EAD): o curso de Pedagogia da Universidade Virtual do Estado de São Paulo (UNIVESP), instituição pública estadual de EaD, possui hoje 17 mil alunos matriculados e atinge 382 municípios paulistas, dos quais 278 não possuem uma única faculdade presencial.


Apenas para começar a analisar as consequências das novas  regras, a continuidade dessas matrículas se tornará inviável a partir do segundo semestre de 2026.


Além deste exemplo prático, a exigência de presencialidade mínima de 50% nas disciplinas do núcleo específico, exigida para as Licenciaturas na modalidade semipresencial, resultará na extinção da oferta em milhares de polos de EaD.


Esta imposição normativa constitui um ato que infringe a inclusão educacional e a redução das desigualdades regionais. Podemos falar também em violação direta do princípio da autonomia universitária quando se subtrai das instituições de ensino superior o poder de definir seus projetos pedagógicos, sua metodologia e sua forma de oferta.


Impor um modelo único de oferta de ensino em desacordo com os princípios do pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas resulta em claro prejuízo ao amplo desenvolvimento dos alunos.


Qualidade dos cursos EAD


Outro ponto que se deve ressaltar é que não há relação entre carga horária presencial e qualidade formativa, como tem demonstrado os dados oficiais do INEP. No curso de Pedagogia, por exemplo, as notas obtidas pelos alunos da EaD no ENADE são equivalentes às notas dos alunos da modalidade presencial, consideradas satisfatórias pelo SINAES. 


Isto significa que não existem evidências de que há diferentes desempenhos acadêmicos entre os estudantes. O que se percebe, por agora, são políticas públicas contrárias ao EaD, trabalhando de encontro ao art. 80 da LDB, que prevê que o Poder Público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada.


A vedação não só reduz as possibilidades de acesso ao ensino superior, como o faz de forma desigual, afetando sobremaneira aqueles que mais dele necessitam. Como mencionado na ADI 7845, trata-se de política pública regressiva, discriminatória e inconstitucional, pois nega a grupos vulneráveis os instrumentos mínimos para a emancipação social por meio da educação. Reforçam-se as desigualdades já existentes, transformando um modelo historicamente inclusivo em uma ferramenta de segregação.


E o ensino a distância nunca foi uma opção meramente instrumental, mas sim uma modalidade legítima de efetivação do direito fundamental à educação, consagrado na Constituição da República.


Perceber o


“EAD como “educação de segunda classe” – ao impor-lhe um regime mais restritivo do que o aplicado ao ensino presencial – deslegitima-se o esforço de milhões de brasileiros para superar a pobreza, para romper o ciclo intergeracional de exclusão e para realizar o ideal republicano da cidadania educada.” (Trecho da ADI n. 7845).

 

Interiorização


Uma das causas do crescimento do EaD foi justamente sua capilaridade. O senso da educação superior realizado pelo INEP em 2018 demonstrou que havia 299 IES públicas e 2.238 IES privadas no Brasil, totalizando 2.537 IES em todo o vasto território nacional.


À época eram 5.570 municípios para 2.238 instituições de ensino superior, com grande concentração de IES nas regiões mais populosas do país, deixando extenso território carente.


A excelente capilaridade, então, proporcionada pela internet, permitia que o interessado, onde quer que estivesse, se beneficiasse do estudo a distância através de cursos nesta modalidade. O estudante acessa os cursos de onde estiver, no tempo que escolher, bastando o adequado acesso à rede. 


E é aí que o EaD deixa de ser – mais uma vez - apenas uma alternativa, mas um vetor importante de interiorização do ensino superior, promovendo o que a Constituição denomina de “redução das desigualdades sociais e regionais” (art. 3o, III).


Igualdade


E a legislação educacional atesta a validade nacional dos estudos feitos via EaD. Desde que as instituições de ensino que oferecem cursos regulares sejam previamente credenciadas pelo Poder Público, elas podem emitir diplomas e certificados com validade nacional. 


O diploma de uma graduação a distância é tão válido quanto o diploma de um curso presencial; o diploma conquistado em uma graduação EAD é idêntico ao conquistado em uma graduação presencial. Não há - e não pode haver - nada no documento que diferencie o curso realizado entre presencial ou a distância. Na prática, portanto, tratam-se de diplomas com valores e pesos idênticos.


Quando falamos da imposição, pelo Decreto n. 12.456/2025, de barreiras à expansão do EaD e das restrições indiretas à sua viabilidade – como exigências desproporcionais de presencialidade docente em polos descentralizados – rompe-se com a lógica constitucional do dever estatal de fomento à educação, invertendo-a em diretriz proibitiva dissimulada de regulação.


Repita-se que o ensino a distância não é, na maioria das vezes, uma escolha de conveniência individual, mas uma estratégia de sobrevivência coletiva para milhares de estudantes que, sem tal modalidade, estariam condenados à exclusão educacional.


Quando o Estado brasileiro publica norma que balda a expansão do ensino superior em sua modalidade mais inclusiva e acessível, desconsidera seus efeitos sobre os grupos historicamente marginalizados e não opera, inclusive, com a equidade necessária para assegurar, “em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, o acesso à educação, em todos os níveis e modalidades, inclusive por meio da oferta de tecnologias assistivas e recursos pedagógicos adequados” (art. 28, §1o do Estatuto do Deficiente).


Enfim, a vedação explícita do EaD em determinados cursos reduz as possibilidades de acesso ao ensino superior, afetando os estudantes mais vulneráveis. Trata-se de política pública discriminatória e inconstitucional, que, se mantida, dificulta a emancipação social por meio da educação. 

ree

Gostou deste texto? Faça parte de nossa lista de e-mail para receber regularmente materiais como este. Fazendo seu cadastro você também pode receber mais informações sobre nossos cursos, que oferecem informações atualizadas e metodologias adaptadas aos participantes.

  

Temos cursos regulares, já consagrados, dos quais já participaram mais de 800 profissionais das IES. Também modelamos cursos in company sobre temas gerais relacionados ao Direito da Educação Superior, ou mais específicos. Conheça nossas opções e participe de nossos eventos.


No momento estão abertas as inscrições para nosso Curso sobre as novas regras do EAD. Entenda as transformações da modalidade desde a Lei de Diretrizes e Bases, de 1996, e conheça as perspectivas na área. Acesse e inscreva-se.

Comentários


bottom of page