Mais ou menos? Saiu o primeiro resultado do edital para cursos de medicina
- Edgar Jacobs
- 2 de fev.
- 4 min de leitura
No dia 31 de janeiro de 2025, o Ministério da Educação divulgou o resultado da fase de admissibilidade e habilitação do chamamento público para novos cursos de medicina. Após alguns adiamentos, o processo finalmente entra em sua etapa decisiva, permitindo uma projeção inicial dos prováveis vencedores.
O edital previa a abertura de até 95 cursos, mas os dados indicam que apenas 82 serão viabilizados. Essa redução é o principal aspecto negativo até agora. O motivo? Em estados como Ceará, Pará e Bahia, houve propostas para menos regiões do que as listadas no edital. Na Bahia, por exemplo, era possível contemplar 15 das 16 regiões de saúde previstas, mas apenas 12 tiveram instituições habilitadas. Como o edital prevê a seleção de apenas uma proposta por região de saúde, as demais ficarão sem novos cursos.
No total, mais de 30 propostas foram apresentadas na Bahia, mas as Instituições de Ensino (IES) não aderiram integralmente à distribuição proposta. Como resultado, três cursos deixarão de ser abertos. O cenário evidencia uma desconexão entre a lógica de mercado adotada e a estratégia distributiva do governo. Isso reforça um ponto crucial: políticas públicas que dependem da iniciativa privada não podem ignorar totalmente a lógica econômica baseada em custo-benefício.
O impacto vai além da redução de cursos. Cerca de 10% das regiões com necessidade social ficarão sem novas escolas médicas, enquanto um percentual semelhante teve apenas uma proposta habilitada, eliminando a concorrência. Se a intenção era escolher as melhores instituições para todas as regiões selecionadas, essa dinâmica pode comprometer o objetivo.
O resultado final será divulgado em março, quando o MEC analisará as propostas técnicas e a experiência regulatória para classificar as propostas por estado e, posteriormente, por região de saúde. Em locais com uma única proposta habilitada, se os documentos não contiverem erros graves, a vaga será automaticamente atribuída ao único proponente. Isso pode gerar distorções. Ainda usando a Bahia como exemplo, as oito melhores propostas podem ter sido para Teixeira de Freitas, que teve a maior concorrência, mas apenas uma será selecionada. Enquanto isso, em Itaberaba, onde houve apenas uma proposta, a habilitação ocorrerá independentemente de nota elevada, o que pode resultar na exclusão de projetos mais qualificados em outras regiões.
Entre algoritmos, fatos e ordens judiciais
Apesar da forte concorrência em estados como Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul, a expectativa era que a lógica distributiva do edital se sobrepusesse às dinâmicas de mercado, garantindo a oferta de todos os cursos previstos. No entanto, a redução de 10% no total de cursos e o mesmo percentual de regiões sem concorrência são sinais preocupantes. Além disso, há risco de fortalecimento da concentração de mercado, pois a maioria dos cursos deve ser conquistada por instituições já atuantes na área de medicina.
Uma das possíveis razões para essa desconexão entre resultados e objetivos é o uso de algoritmos para definir as regiões de saúde no edital. Algoritmos processam dados, mas não captam nuances locais essenciais para uma boa implementação. Até 2018, os editais incluíam um processo criterioso de seleção de municípios, considerando o interesse local e a infraestrutura de saúde. Apesar de falhas, esse modelo sinalizava que as cidades escolhidas tinham condições para receber os cursos. A versão atual dificilmente pode ser considerada um aprimoramento.
O contexto se agrava porque o Conselho Nacional de Educação (CNE) vem endossando a postura restritiva do MEC, o que pode resultar na aprovação de ainda menos cursos de medicina. Os cursos abertos por meio de judicialização, entre 2018 e 2023, poderiam ajudar a solucionar o problema do chamamento público de 2023. Nesse sentido, será essencial que o Conselho avalie com mais cautela as reais necessidades da população, evitando decisões baseadas apenas em estatísticas e algoritmos. Mesmo cursos judicializados, mas bem avaliados, merecem análise ponderada, especialmente após a decisão do STF na ADC 81, que os alinha com a política do Programa Mais Médicos.
Menos cursos, menos médicos, menos atendimento
Na prática, a redução de cursos afeta diretamente a capacidade de atendimento à saúde nos próximos anos. Segundo a Nota Técnica Conjunta nº 3/2023 do MEC, elaborada em parceria com outros órgãos federais, o Brasil precisa de 10.000 novas vagas para atingir a meta de 3,73 médicos por mil habitantes até 2033. O objetivo seria, nesse caso, atingir em 2033 a média da OCDE registrada em 2022. Este já seria um passo tímido, considerando que o país deveria mirar em números mais ambiciosos, compatíveis com seu sistema de saúde universal atual. Mas o que se vê é outro problema: uma redução inesperada no número de cursos causada pela própria formulação do chamamento público.
A consequência prática? Menos 780 vagas de medicina por ano. E essa questão não se resume a números: menos médicos significam menos atendimento e impactos na saúde da população a longo prazo. Se nada for revisto, o Programa Mais Médicos poderá ser lembrado no futuro – talvez tarde demais – como “Menos Médicos”.Mais é menos: saiu o resultado do edital para cursos de medicina.

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