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Nova decisão judicial declara ilegais escolas cívico-militares

Novas escolas cívico-militares foram declaradas ilegais pela Justiça no Rio Grande do Sul nesta última semana. Segundo a juíza que proferiu a sentença,  da 7ª Vara da Fazenda Pública, restou claro que a aplicação do Decreto 10.004/2019, publicado pelo governo federal anterior, extrapolou os limites tanto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação como da Lei Estadual que dispõem sobre a gestão democrática do ensino público.


As escolas cívico-militares


O Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares foi uma iniciativa do Ministério da Educação (MEC), em parceria com o Ministério da Defesa, no período do Governo Bolsonaro. O programa apresentava um conceito de gestão nas áreas educacionais, didático-pedagógica e administrativa com a participação do corpo docente da escola e apoio dos militares.


Na prática foram adotados dois modelos: um — de oferta de pessoal — com militares da reserva das Forças Armadas e outro, onde não houvesse efetivo do Exército, da Força Aérea ou da Marinha, composto por policiais e bombeiros militares. A atuação de todos seria a mesma: trabalhar nas escolas levando mais disciplina e organização.  A grande  diferença seria em como o dinheiro seria investido.


A implementação do modelo dependia de demanda das Secretarias de Educação dos estados. Elas é que procuravam o MEC e apontavam quais escolas poderiam receber o projeto da Secim. Ou seja, o modelo era adotado por meio de adesão.


Fato é que a gestão das escolas cívico-militares, apesar de não estarem totalmente administradas pelo exército, poderia ser ocupada exclusivamente por militares, que poderiam atuar nos seguintes cargos:

 

  • 1 Oficial de Gestão Escolar - Oficial Superior;

  • 1 Oficial de Gestão Educacional - Oficial subalterno/intermediário;

  • 16 Monitores - 1º Sgt/ Suboficial/Subtenente.

 

E a função dos militares se distribuía  tanto na Gestão Escolar, atuando em colaboração com os demais profissionais da escola nas áreas didático-pedagógica, educacional e administrativa, quanto na Gestão Educacional, atuando na supervisão de monitores escolares em apoio à área educacional e na Monitoria Escolar, ocasião em que militares atuariam sob a orientação do oficial de Gestão Educacional, nas áreas educacional e administrativa, em atividades externas à sala de aula, com o intuito de melhorar o ambiente escolar.


A proposta do governo anterior era a de implantar 216 escolas cívico-militares em todo o país até 2023, sendo 54 por ano.


Como foi a implementação do Programa


Implementado em 2019, chegou ao auge em 2020, com cerca de 200 escolas mantidas em parceria do MEC com estados ou municípios.


Porém, o programa atendia apenas 0,1% das escolas públicas e, ainda assim, em 2021 e 2022, ficou entre as 15 maiores verbas discricionárias do governo em relação à educação básica, o que gerou ruído entre as entidades da sociedade civil que lutam pela Educação brasileira.


O fim do  Programa Nacional de Escolas Cívicos-Militares (Pecim)


Em julho deste ano de 2023, o Governo Lula anunciou o fim do Pecim. Alguns governadores, como o do Paraná e o do Rio Grande do Sul, anunciaram que manteriam o programa.


No caso do RS, diante do comunicado do governador, a Intersindical e o CPERS Sindicato ingressaram com uma ação civil pública para impedir a implementação da medida, o que motivou a decisão da justiça que agora repercutimos. Neste momento, portanto, o governo estadual precisará alterar o modelo em 18 escolas estaduais que haviam aderido ao Pecim. As mesmas providências deverão ser tomadas nas escolas municipais que também aplicaram o programa.


Para a deputada estadual Sofia Cavedon (PT), presidente da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, a decisão judicial é um importante reconhecimento do combate a um programa ilegal, que se contrapõe à escola democrática, plural, libertária, inclusiva, que respeita as diferenças e garante a liberdade e direito de escolha de cada criança, de professoras e professores em relação a valores e comportamentos. 


Para ela, as escolas cívico-militares representam homogeneização e padronização, o que não condiz com a educação que se busca no país. E que o aprendizado tem que ser autônomo, através do diálogo, do exercício da diferença e do pensamento reflexivo e não a partir de controles, castigos, sanções e vigilâncias. 


Justiça do Rio Grande do Sul


A decisão judicial proferida neste estado anuncia que o Pecim fere o princípio da gestão democrática do ensino garantido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e a Lei Estadual 10.576/95, que preveem a autonomia na gestão administrativa escolar.


Entende-se que o texto legal vigente estabelece que o exercício da administração do estabelecimento de ensino cabe à equipe diretiva, integrada pelo Diretor, Vice e Coordenador Pedagógico, em consonância com o Conselho Escolar e que o  “modelo” vigente nos colégios militares, embora a gestão pedagógica esteja afeta a pedagogos e profissionais da educação, entrega a gestão administrativa e de conduta a cargo dos militares ou profissionais de segurança pública indicados por outros órgãos, o que, em princípio, não observa o princípio da gestão democrática do ensino garantido pela LDB e, notadamente, pela Lei Estadual 10.576/95.


Daí a colisão com o princípio da autonomia na gestão administrativa escolar por esta lei assegurado, mais especificamente com o disposto nos arts. 4º e 6º, que estabelecem competir o exercício da administração do estabelecimento de ensino à equipe diretiva, integrada pelo Diretor, Vice e Coordenador Pedagógico, em consonância com o Conselho Escolar.


A sentença afirma que a militarização, nos moldes propostos pelo Pecim, afronta o direito de acesso à uma educação pública, gratuita, igualitária, crítica e de qualidade, pois torna impraticável a democracia no âmbito escolar ao reproduzir táticas autoritárias de ensino e controle.


Justiça de São Paulo


A Justiça de São Paulo já havia apontado a ilegalidade do programa em uma decisão do ano passado. Naquela ocasião, em votação unânime, o Tribunal de Justiça  decidiu pela inconstitucionalidade da lei 17.359, de 31 de março de 2021, e apontou a necessidade de interrupção imediata do programa.


A decisão ocorreu em ação judicial ajuizada pelo Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), que comemorou a decisão alegando que o programa pretendia usurpar verbas e estrutura das escolas públicas para fins militaristas e que, do ponto de vista pedagógico, pretendia formatar as mentes das crianças e jovens com a mesma finalidade.


O sindicato também sustentou que as escolas cívico-militares não são confessionais, mas, sim, ideológicas, já que há um conjunto de ideias, não educacionais, que moldam o que se pretende como modelo de ensino. Para a entidade, há um conteúdo ideológico calcado na crença de que valores militares influenciam positivamente no ensino, além de o programa instituir regime de trabalho autoritário e abusivo em relação aos profissionais da educação, não reconhecendo nem valorizando a importância da profissão.


Enfim, desde julho deste ano o programa chegou ao fim e  a resistência de alguns estados em suspendê-lo não tem sido acolhida pela justiça, que já gerou decisões que lhes foram desfavoráveis.


E as escolas que se tornaram cívico-militares, aproximadamente 200 em todo o país,  terão de retomar o ensino proposto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

  



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