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STF decide que intervalo escolar integra jornada de trabalho de professores

O Supremo Tribunal Federal decidiu que o recreio escolar, na educação básica,  ou o intervalo de aula, na educação superior, compõe a jornada de trabalho dos professores e, logo, devem ser remunerados. A decisão ocorreu no julgamento de uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, finda na sessão do dia 13 de novembro de 2025.


O porquê do debate


A ADPF n. 1058 foi ajuizada por uma associação de mantenedoras de instituições de ensino superior, pleiteando o reconhecimento da inconstitucionalidade de um conjunto de decisões judiciais proferidas no âmbito da Justiça do Trabalho, tidas por violadoras de preceito fundamental por terem criado “uma presunção absoluta de existência de tempo à disposição por parte dos professores quando da realização dos intervalos de 15 minutos denominados de recreio, independentemente de prova de efetiva disponibilidade ou de efetivo trabalho”.


De acordo com o pedido, o TST, para conferir interpretação à lei, estaria infringindo os limites de sua competência, ao arrepio  da  CLT, que já disciplina a matéria. Ao presumir que o intervalo de recreio constituiria necessariamente tempo a disposição do empregador, o TST  estaria negando vigência à obrigatoriedade do intervalo de 15 minutos em jornadas superiores a quatro horas e inferiores a seis (art. 71, §1°, da CLT), inovando no ordenamento e atuando contra legem em hipótese que sequer configura lacuna legislativa.


A associação afirmou, ainda, que intervalos a serem computados como tempo integrante da jornada de trabalho foram previstos de maneira expressa e taxativa pelo legislador, incidindo, na hipótese, a regra geral do art. 71 da CLT, não havendo base legal para a criação da presunção absoluta.


Foi neste contexto que se requereu, via ADPF:


  • a suspensão de qualquer processo (ou, dependendo do caso, dos efeitos de decisões judiciais neles já proferidas) em que se discuta a aplicação do entendimento sustentado pelo TST da consideração dos intervalos intrajornadas de 15 minutos (recreios), por presunção absoluta, como tempo à disposição e

  • a declaração de inconstitucionalidade do entendimento fixado pelo conjunto de decisões judiciais impugnadas, pautado na presunção, em absoluto, de que o intervalo referente ao recreio escolar deve ser necessariamente compreendido como tempo à disposição do empregador.


Como foram os votos


O relator, Ministro Gilmar Mendes, votou inicialmente para afastar a inclusão automática do recreio escolar como tempo à disposição do empregador. Para ele, a CLT não equipara o recreio aos intervalos especiais que integram a jornada e a tese fixada pelo TSTparece-lhe vulnerar não apenas o princípio da legalidade, como também os princípios da livre iniciativa e da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva.


Assim, para o relator, para se verificar  a efetiva duração da jornada de trabalho, impõe-se a efetiva comprovação do período de tempo em que o empregado permanece às ordens de seu empregador – o que, na maioria das vezes, ocorre mediante o exame do próprio contrato de trabalho cotejado com os meios de prova usuais no âmbito das relações de trabalho, a exemplo do registro de ponto.


Tais situações, em seu sentir, somente podem ser aferidas a partir das peculiaridades fáticas de cada caso concreto e o TST o estaria fazendo por meio de presunções sem previsão legal e de qualquer substrato fático.


Posteriormente, o ministro Flávio Dino votou com um ponto de divergência, sustentando que o recreio e os intervalos entre aulas compõem a jornada, uma vez que o professor permanece sujeito ao poder diretivo da escola. Para o ministro, o art. 4º da CLT considera como tempo à disposição todo o período em que o empregado permanece no ambiente laboral, não se justificando exigir prova de trabalho efetivo durante estas ocasiões.


Na verdade, foi afastada apenas a presunção absoluta, permitindo-se que esses períodos não sejam computados caso o professor permaneça na escola exclusivamente para tratar de assuntos pessoais, caso em que o ônus da prova recai sobre o empregador.


Os ministros Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso seguiram a divergência.


Reajuste no voto do relator


Após debates nas sessões dos dias 12 e 13 de novembro, houve um reajuste no voto do relator, ministro Gilmar Mendes.


Ele aderiu ao entendimento de que a regra geral é que os períodos de recreio ou intervalos devam ser tempo à disposição do empregador.


A decisão, todavia, afasta a presunção absoluta nesse sentido e estabelece como ressalva que, se nesse período o professor se dedicar a atividades de cunho estritamente pessoal, ele não deve ser considerado no cômputo da jornada diária de trabalho. A obrigação, repita-se, de comprovar a ocorrência dessas hipóteses é do empregador. 


A modelação de efeitos sugerida pelo Ministro Cristiano Zanin


O ministro Cristiano Zanin votou com o relator, Gilmar Mendes, entendendo que o recreio, em regra, integra a jornada, mas sem presunção absoluta, admitindo prova em contrário. Destacou que o professor costuma ficar à disposição da escola no intervalo.


Uma sugestão sua durante o julgamento obteve a adesão da maioria e, em nosso entender, foi excelente a iniciativa.


Ele sugeriu mencionar o §2º do art. 4º da CLT na tese e pediu que o Supremo Tribunal Federal defina os efeitos temporais da decisão, avaliando possível impacto retroativo, ou seja: a decisão deve produzir efeitos apenas a partir de agora, de modo que aqueles que receberam algum valor de boa-fé não sejam obrigados a devolvê-lo. 


É uma clássica possibilidade de modelar os efeitos da decisão nas ações de controle de constitucionalidade para garantir maior segurança jurídica diante do cenário que se formou.


Outros votos 


O ministro Edson Fachin ficou vencido, uma vez que considerou constitucionais as decisões do TST e votou pela improcedência da ADPF. Para ele, o período do intervalo/recreio caracteriza tempo à disposição, e a jurisprudência da Justiça do Trabalho resulta de interpretação legítima do art. 4º da CLT. Ele destacou que exigir prova de trabalho efetivo distorce o critério legal do tempo à disposição; que a controvérsia é infraconstitucional e que as decisões questionadas estão inteiramente em harmonia com os preceitos constitucionais do valor social do trabalho. 


A ministra Cármen Lúcia, assim como os ministros André Mendonça e Luiz Fux, acompanhou a divergência suscitada por Flávio Dino. Eles afirmaram que o intervalo integra a jornada porque o professor permanece presente e submetido ao poder diretivo da escola, superando a preliminar de subsidiariedade. Todos ressalvaram a possibilidade de prova, pelo empregador, de liberação efetiva do docente durante o intervalo.


O ministro Kassio Nunes Marques também votou para afastar a presunção absoluta de que o recreio integra a jornada e apontou que o tema deve ser tratado em suas particularidades, caso a caso, cabendo ao empregador provar que o professor teve intervalo real e efetivo.


Confirmada a tese do TST


Enfim, o Supremo Tribunal Federal  confirma o entendimento do TST sobre a matéria e conclui que a regra geral é a de que o professor está à disposição do empregador também no intervalo e que o pagamento deste período pode ser afastado caso o empregador comprove que o docente usa esse tempo para atividades de cunho estritamente pessoal. Apenas nesse caso, o intervalo não será considerado no cômputo da jornada diária de trabalho.

 

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