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IES devem informar alunos sobre diferenças entre licenciatura e bacharelado

O assunto foi pauta de uma ação de obrigação de fazer cumulada com dano moral, em que a autora era aluna do curso de licenciatura plena de Educação Física em uma instituição de ensino superior, tendo iniciado o curso no segundo semestre de 2006. Fato que, depois de formada, viu-se impossibilitada de exercer algumas das atividades profissionais que seriam desempenhadas apenas por aqueles que cursaram o bacharelado.


Na ação que ajuizou contra a instituição, sustentou ter sido enganada pela ré que, no seu site, teria garantido aos futuros alunos inexistir limitação ao exercício da profissão por aqueles portadores de diploma de licenciatura plena, isto no ano de 2006, quando de sua entrada na universidade, quando já vigente a separação ocorrida no curso de Educação Física.


Um dos pedidos contidos na ação foi que a ré fosse obrigada a complementar o Curso de Educação Física de forma gratuita a fim de que a estudante obtivesse o Diploma de Bacharel, além de sua condenação ao pagamento da indenização por danos morais.


Vale dizer que o mérito da ação, que culminou na condenação da instituição de ensino, se relaciona com o dever de informação da fornecedora dos serviços educacionais, pelo que entendemos importante a atenção à informação clara e transparente acerca de todas as particularidades do curso ofertado, orientando e advertindo seus alunos, inclusive e especialmente acerca da separação entre bacharelado e licenciatura. É uma forma de se proteger e atuar preventivamente contra eventuais questionamentos judiciais.


As razões apresentadas pela instituição de ensino


Em segunda instância os argumentos da instituição de ensino foram acolhidos. O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro entendeu corretos seus procedimentos e julgou improcedentes os pedidos da estudante pelas seguintes razões:


De acordo com o TJRJ, a estudante iniciou o curso de Educação Física oferecido pela IES/ré no segundo semestre de 2006, tendo colado grau em 25/08/2010. Dessa maneira, se inscreveu no vestibular quando a Resolução CONFEF nº 94/05 já estava em vigor há mais de um ano e, nesse contexto, tinha ao seu alcance e disposição todas as informações necessárias e indispensáveis para identificar com precisão qual o curso estava sendo oferecido pela universidade, bem como sua extensão no campo de atuação profissional.


Em relação à sustentação de ocorrência de vício de informação contido na página da internet mantida pela ré, informando que o curso em questão permitiria ao profissional o pleno exercício de suas funções, inclusive em clubes e academias, o Tribunal entendeu que iria de encontro com o edital do vestibular realizado pela aluna e no qual nitidamente constava tratar-se de licenciatura.


A decisão de segunda instância continua esclarecendo que outros cursos superiores fazem esta distinção entre formação acadêmica, ou seja, distinção entre licenciatura e bacharelado e que era razoavelmente esperado e exigível da candidata que pretendia ingressar no ensino superior o mínimo de conhecimento para identificar e diferenciar uma da outra.


No nosso entendimento também não havia qualquer erro da ré, pois a aluna matriculou-se em data posterior a 15/10/2005, ocasião em que seu curso de licenciatura não poderia ser reconhecido pelo Ministério da Educação como bacharelado. E se havia algum problema do Conselho Regional de Educação Física em reconhecer a validade desse diploma, tal como afirma o Ministério da Educação, essa é uma questão que poderia ser resolvida nas vias próprias e adequadas, entre o profissional de educação física e seu conselho regulador, e não com a instituição de ensino, que cumpriu com as diretrizes determinadas pelo Órgão Federal que regula o ensino superior.


Todavia, como não foi esse o entendimento do STJ, que reformou em sede de recurso especial a decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, as instituições de ensino, como já informamos, devem se precaver de todas as eventualidades, fazendo ampla publicidade dos serviços prestados e garantindo toda a informação dos cursos oferecidos.


O recurso especial nº 1738996 - RJ (2018/0104055-2)


No recurso especial sustentou-se a afronta ao art. 6º, III, e IV, do CDC, relativos à facilitação da defesa do consumidor e ao direito à informação adequada e clara sobre os serviços prestados. Alegou-se também violação aos arts. 30, 37, §§ 1º e 3º do CDC, que dispõe sobre a vinculação decorrente da informação ou publicidade veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação pelo fornecedor dos serviços, obrigando-o e integrando o contrato que vier a ser celebrado.


Por fim, foi suscitada a vedação da propaganda enganosa, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito das características e propriedades dos serviços ou, ainda, a omissão quando se deixa de informar sobre dado essencial do produto ou serviço.


Pelo que consta do acórdão, havia no site da instituição informação que contrariava o edital do vestibular que concorreu a estudante. Houve, portanto, segundo o ministro relator, fortes indícios de que haveria um conflito de informações prestadas aos alunos da instituição, evidenciando uma violação aos dispositivos da lei consumerista que permitiria reconhecer a vulnerabilidade técnica e informacional dos consumidores.


O fato de a estudante ter participado do vestibular para o curso de licenciatura e ter tido acesso ao edital que explicava em detalhes como seria sua trajetória acadêmica não retirou a responsabilidade da instituição, que deveria ter tido o cuidado de alertar todos os vestibulandos que prestaram o concurso naquele ano e que, posteriormente, realizaram a matrícula em maio de 2006.


Portanto, ainda que a distinção tenha sido oriunda de norma regulamentar dos Conselhos profissionais, não ficaram as Sociedades de Ensino eximidas de comprovar que prestaram todas as informações possíveis aos alunos que se matricularam no curso de Licenciatura em Educação Física a respeito das novas restrições impostas.


Informação adequada e clara


O STJ recuperou a decisão do juiz de primeira instância e entendeu que ela estava em plena consonância com as disposições dos arts. 6º e 30 do CDC, ou seja, de que é direito do consumidor e dever do fornecedor a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços por ele fornecidos, estando o vulnerável protegido contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas abusivas no fornecimento de produtos e serviços.


As informações prestadas pelo fornecedor, ademais, obrigam-no e integram o contrato que for celebrado. Poderia a demandada rechaçar a alegação de que o sítio eletrônico por ela administrado não conteria informação equívoca como alegado pela demandante. O ônus dessa prova era seu e, todavia, não fora devidamente satisfeito. A conjectura de que poderia ter havido fraude na confecção da referida prova, emprestada de processo outro, sem, todavia, ter ela sido evidenciada, acaba por fazer defesa à presunção da má-fé do aluno, o que o direito posto não corrobora, senão a presunção de sua boa-fé. Por outro lado, cumpria à demandada evidenciar a correção das informações prestadas à aluna e essa prova não fora satisfeita na hipótese dos autos, consoante o juízo sentenciante. É insuficiente o fato de a aluna ter-se matriculado para o curso de licenciatura como reconhecido no acórdão, pois este fato não enfraquece o argumento de que a informação prestada pela instituição fora deficiente e que teria sido garantido o amplo exercício da profissão à consumidora. (Trecho do recurso especial nº 1738996 - RJ (2018/0104055-2)).

Enfim, entendeu-se pela falha na prestação dos serviços e pela existência de dano moral decorrente da frustração das legítimas expectativas profissionais da autora, pelo que a instituição de ensino foi condenada ao pagamento de indenização arbitrada em R$ 5.000,00. A IES também foi condenada a complementar o curso da estudante com as cadeiras relativas ao bacharelado, de modo a que ela venha a exercer plenamente a atividade profissional como originalmente informada.


Por fim, vamos nos lembrar que já foi publicado pelo STJ o Tema Repetitivo 647, de 2014, que informa que:


Ao profissional formado em educação física, na modalidade licenciatura de graduação plena, somente é permitido atuar na educação básica, sendo-lhe defeso o exercício da profissão na área não formal.

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