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Termo de adesão é o caminho para escapar da burocracia dos cursos de Medicina.

Atualizado: 25 de mar.

A mitologia grega narra a saga de Sísifo, progenitor de Éolo, deus dos ventos, notável por sua sagacidade e astúcia. Sísifo desafiou a morte, ludibriando-a por duas vezes. Como castigo por sua audácia e engenhosidade, os deuses lhe impuseram um castigo eterno: ele deveria empurrar um imenso rochedo até o topo de uma montanha, apenas para assistir a pedra rolar montanha abaixo, reiniciando seu esforço ad infinitum. Este mito reflete a luta incessante e infrutífera, uma metáfora da ineficiência e do ciclo repetitivo sem alcançar um resultado final satisfatório.

 

Esta narrativa mitológica se assemelha à experiência das IES que buscam a autorização para cursos de medicina sob condição judicial. Essas instituições enfrentam um ciclo aparentemente interminável de esforços, reminiscentes da tarefa de Sísifo, onde, ao aproximar-se da conclusão, veem-se obrigadas a recomeçar o processo.

 

Após extensos períodos de indecisão e resistência por parte do MEC, aliados a ordens judiciais para acelerar os processos administrativos, as IES encontram-se em um impasse contínuo. Realizaram investimentos significativos, tanto financeiros quanto de tempo, mas se veem constantemente retornando ao ponto de partida, aguardando um progresso administrativo que parece nunca chegar.

 

A inação da União em relação à autorização de novos cursos de medicina é notória, sem a publicação de nenhuma Portaria regulamentadora desde agosto de 2023, quando o STF proferiu as decisões iniciais na ADC 81. Isso sugere uma resistência do MEC em avançar, possivelmente devido a um comprometimento com seu próprio cronograma de expansão, ainda não efetivado.

 

A sequência de ações inclui o adiamento de visitas in loco previamente agendadas e a criação de normativas sobre um padrão decisório, evidenciando que, apesar dos esforços, a União, por meio da Secretaria de Regulação do MEC, não avançou nas decisões. Passados seis meses de suposta preparação para cumprir a decisão do STF, o cenário atual aponta para um descumprimento de ordens judiciais.

 

Tal situação foi percebida pelo Judiciário, que, em suas diversas instâncias, começou a impor medidas para efetivar suas ordens, incluindo multas, pedidos de processos disciplinares e, recentemente, autorizações para realização de vestibulares.

 

Diante desse panorama, as IES podem se posicionar de maneira estratégica. Conhecer e preparar-se para contestar os critérios adotados pela SERES é fundamental. Por exemplo, a "necessidade social", conforme descrito na Nota Técnica n° 81/2023/CGLNRS/GAB/SERES/SERES, levará em conta municípios com uma densidade de médicos por habitante inferior a 3,73, além de considerar aqueles inseridos em regiões de saúde priorizadas no Edital n.º 01, de 2023 (Edital Mais Médicos):

 

4.9. Diante disso, propõe que sejam pré-selecionados todos os municípios cuja concentração de médico por habitante seja inferior a 3,73, já que esta é a meta do Edital n° 01, de 2023 e, consequentemente, um padrão que pode ser observado também aos pedidos protocolos por decisão judicial em tramitação no MEC, reforçando a coerência com a expansão de vagas de Medicina no sistema da educação superior brasileira.
4.10. Em complemento, e também com a finalidade de preservar a coerência da política, sugere-se a inclusão nesta pré-seleção de todos aqueles municípios que integram as regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 2023.
4.11. Isto posto, para fins de atendimento ao art. 3º, §19, da Lei n° 12.871/2013, os pedidos de abertura de novos cursos de Medicina e de aumento de vagas poderão ser aprovados se estiverem em regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 4 de outubro de 2023 ou em municípios cuja concentração de médico por habitante seja inferior a 3,73.

  

Em relação à infraestrutura, o Ministério da Saúde aponta um erro da SERES: as redes de atenção à saúde do SUS, bem como suas ações, programas e equipamentos públicos, estão sob a responsabilidade dos gestores do SUS em cada esfera governamental, o que significa que são os municípios os responsáveis pelas informações que permitirão atestar o atendimento a este requisito. Assim, o envio do termo de adesão e plano de contrapartidas mostra-se imprescindível para a análise do pedido, documentos que devem ser anexados ao processo administrativo mesmo antes da diligência instaurada pela SERES. Isso é o que consta em um documento do Ministério da Saúde anexado em processo judicial:

 

3.6. Assim sendo, compreende-se que apenas as redes de saúde dos municípios com termos de adesão anexados ao processo podem ser objetos de análise. Vale destacar que a legislação atual pressupõe a consideração das redes de saúde de outros municípios na avaliação estrutural. Portanto, apenas propostas com termos de adesão de municípios que façam parte da mesma região de saúde do município sede do curso elencado no processo judicial poderão ser consideradas na análise da rede de saúde do processo em tela.

 

No caso, o Município deve comprometer-se a oferecer a estrutura de serviços, ações e programas de saúde necessários à implantação e funcionamento do curso de graduação em medicina a ser ofertado, nos termos previstos no projeto pedagógico da IES. Igualmente, devem garantir a disponibilidade dos equipamentos públicos adequados e suficientes para a oferta do curso de Medicina, incluindo, “no mínimo, os seguintes serviços, ações e programas: a) atenção básica; b) urgência e emergência; c) atenção psicossocial; d) atenção ambulatorial especializada e hospitalar; e e) vigilância em saúde.[1]

 

Em resumo, as IES devem antecipar-se à diligência e providenciar, desde já, a assinatura dos termos de adesão e dos planos de contrapartidas, que devem atender à percentagem estabelecida pela Portaria 531/2023.

 

Adicionalmente, a documentação referente aos leitos disponíveis deve ser meticulosamente preparada e apresentada, visto que este é um dos critérios cruciais para a aprovação do pedido.

 

A trajetória das IES na busca pela autorização de seus cursos de medicina remete, em certa medida, ao mito de Sísifo, simbolizando uma luta persistente contra desafios aparentemente intermináveis. Contudo, diferentemente da sina de Sísifo, o esforço das instituições tem o potencial de culminar em um resultado positivo e concreto.

 

A reflexão proposta por Albert Camus em "O Mito de Sísifo", que vê no enfrentamento do absurdo um caminho para conferir significado à existência, pode ser uma inspiração para as IES. Assim, encarar os obstáculos burocráticos e as complexidades do processo não apenas como barreiras, mas como parte de um percurso rumo à realização de seus objetivos educacionais e sociais.

 

Diante disso, as instituições são encorajadas a utilizar as adversidades como estímulo para a perseverança, equipando-se com conhecimento e estratégias jurídicas e administrativas para navegar pelo processo de autorização. Esta abordagem proativa e bem-informada é crucial para superar os entraves e finalmente alcançar o sucesso na ampliação do acesso à educação médica de qualidade no país.

 

Portanto, a luta das IES, embora repleta de desafios, diferencia-se da eterna punição de Sísifo pelo potencial de alcançar um desenlace favorável, marcado pela aprovação dos cursos de medicina e pela contribuição significativa para a formação médica no Brasil. A determinação e o esforço contínuo, ancorados em uma estratégia jurídica e administrativa sólida, têm o poder de transformar o cenário atual, convertendo desafios em oportunidades para avançar na missão de formar novas gerações de médicos.


[1] Conforme o EDITAL DE CHAMADA PÚBLICA PARA SELEÇÃO DE PROPOSTAS PARA AUTORIZAÇÃO DE FUNCIONAMENTO DE CURSOS DE MEDICINA NO ÂMBITO DO PROGRAMA MAIS MÉDICOS, disponível em https://www.gov.br/mec/pt-br/areas-de-atuacao/es/chamamentos-publicos-cursos-de-medicina/sei-mec-4636174-edital-compilado.pdf.


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