top of page

Transferência de alunos de cursos de Medicina de IES estrangeiras para IES nacionais

Aproveitando uma consulta realizada por Instituição de Ensino Superior do estado de São Paulo, o CNE, tendo em vista o relatório produzido pela Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior – SERES -, orientou sobre o procedimento acerca da transferência de alunos do curso de Medicina provenientes do exterior para as IES brasileiras, sobretudo no que diz respeito à "validação de conhecimentos específicos".


O CNE, de pronto, comunicou que a matéria havia sido objeto de questionamentos anteriores sobre os quais a SERES já havia se debruçado e emitido posicionamento nos termos da legislação vigente, remetendo quaisquer definições a respeito ao âmbito da autonomia universitária.


Autonomia universitária


O artigo 207 da Constituição Federal prevê que as universidades terão autonomia em três dimensões: didático-científica, administrativa e de gestão financeira-patrimonial.


A autonomia didático-científica confere à universidade o direito de escolher o que será lecionado em sala de aula e quais pesquisas serão conduzidas em seus laboratórios. A administrativa garante que a universidade tem liberdade para contratar quem quiser e ser administrada sem a interferência de qualquer governo, como escolher ou eleger reitores e diretores. Por fim, a autonomia financeira e patrimonial assegura que a universidade é quem decide como e onde será gasta a verba que ela recebe do governo federal ou estadual. Ela opta por investir e da forma que quiser e ninguém de fora pode interferir.


No caso, ao que tudo indica, o CNE explicita que a questão formulada em consulta diz respeito à autonomia administrativa da instituição de ensino. É considerada, inicialmente, a Lei n° 9394/1996 (LDB), que assegura, em seu artigo 49, a possibilidade de transferência de alunos regulares entre Instituições de Ensino Superior e cursos afins:


Art. 49: "As instituições de Educação Superior aceitarão a transferência de alunos regulares, para cursos afins, na hipótese de existência de vagas, e mediante processo seletivo”.

Assegurada legalmente a possibilidade de transferência de alunos regulares entre instituições de educação superior, cabe ao estudante interessado dirigir-se à IES para onde pretende se transferir, munido da documentação exigida, nos termos da legislação vigente e do Regimento Interno da instituição.


O Parecer CNE/CES n° 365/2003 disciplina os procedimentos envolvidos no processo de transferência, esclarecendo que incumbe à instituição de destino, desde que exista vaga e feito o processo seletivo, matricular o aluno transferido.


Já o estabelecimento de origem deve comprovar o vínculo do aluno, emitindo a chamada Guia de Transferência, acompanhada do correspondente histórico escolar. O estabelecimento destinatário, se houver vagas e procedendo ao processo seletivo, poderá matricular o aluno transferido, respeitando o período letivo que se cursa.


A ideia é respeitar – frise-se - o exercício do poder discricionário da instituição de destino.


Transferência de IES dentro do país - aproveitamento dos estudos


A Portaria Normativa MEC n° 230/07 define que a transferência de estudantes de uma instituição de ensino superior para outra deve ser feita mediante a expedição de histórico escolar ou documento equivalente que ateste as disciplinas cursadas e a respectiva carga horária, bem como o desempenho do estudante.


Caso a transferência seja para "cursos afins" pode haver o aproveitamento de estudos já realizados pelo estudante na instituição de origem. A esse respeito, o art. 47, § 2°, da Lei n° 9.394/1996 assegura que "os alunos que tenham extraordinário aproveitamento nos estudos, demonstrado por meio de provas e outros instrumentos de avaliação específicos, aplicados por banca examinadora especial, poderão ter abreviada a duração dos seus cursos, de acordo com as normas dos sistemas de ensino'”.


O aproveitamento dos estudos é feito na forma prevista e disciplinada no estatuto ou regimento das próprias instituições de educação superior de destino, observada a autonomia didático-pedagógica, o que independe de norma específica expedida pelo MEC. Nesse ponto, o Parecer CNE/CES n° 91/2003 esclarece que "a oportunidade ou não de aproveitar estudos é da competência da instituição de ensino que ministra o curso a que se requer aproveitamento de estudos, observada a legislação vigente''.


Assim, entende-se que o tema da transferência entre instituições brasileiras já está regulamentado na legislação e normativas de forma clara.

Transferência de IES estrangeira para IES brasileira - cursos de Medicina


O curso de Medicina é tratado em regime especial no Decreto 5.773/2006. Seu art. 28, por exemplo, que trata da autonomia das universidades e centros universitários para autorização de funcionamento de curso superior, excepcionaliza dessa prerrogativa a criação de cursos de graduação de Medicina, Direito, Odontologia e Psicologia.

Os cursos de Medicina dependem de manifestação prévia do Conselho Nacional de Saúde para funcionamento e reconhecimento, o que é, também, uma exceção à autonomia das universidades e centros universitários, circunscrita à matéria.


Assim, alguns pontos merecem ser levados em conta na hipótese de se considerar necessária uma regulamentação específica para a transferência de alunos de cursos de Medicina de IES estrangeira para IES brasileira:


  1. a existência de um exame específico para validação de diplomas de cursos de Medicina emitidos no exterior, denominado Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos expedidos por Universidades Estrangeiras – o REVALIDA, exigido de todos os portadores de diploma de curso de Medicina emitido no exterior que desejem exercer a profissão de médico no Brasil;

  2. os riscos decorrentes de eventual assimetria, em termos curricular e de qualidade, entre cursos de Medicina e inerentes à admissibilidade de transferência de alunos de IES estrangeira para IES brasileira em fase já bastante adiantada da formação na perspectiva de emissão do diploma no país;

  3. e a necessidade de convivência não conflitiva e sem sobreposição entre a exigência, de um lado, do REVALIDA, e, de outro, a possibilidade de transferência de alunos conforme mencionado no item "2", de forma que não se fragilize o exame de revalidação e a própria política regulatória dos cursos de Medicina no país.


No caso, a SERES, considerando a relevância social do curso e a responsabilidade em assegurar a qualidade da formação do médico, pondera se não seria oportuno exigir a aplicação do exame REVALIDA a todos os alunos transferidos para IES brasileiras com mais de 50% da carga horária cursada em IES estrangeiras e recomendou o encaminhamento do tema ao Conselho Nacional de Educação – CNE.


Decisão do CNE


O CNE, ao analisar o tema, indicou à época que a Resolução CNE/CES n. 03/2016, que trata do tema de revalidação de títulos estrangeiros fosse utilizada. Ou seja, admite que deva ser utilizado um tratamento similar ao que é utilizado para a revalidação de títulos estrangeiros para o aproveitamento de estudos. Isso quer dizer que a Instituição de Ensino Superior deve partir de uma análise documental e, sempre que necessário, aplicar testes e exames no estudante.

Atente-se para o fato de que a Resolução CNE/CES n. 03/2016 foi revogada pela Resolução CNE/CES nº 01/22; porém, foram poucas as mudanças trazidas por essa mais recente normativa. Uma é a inclusão dos Institutos Federais para revalidação/reconhecimento de diplomas estrangeiros. A norma prevê a equiparação dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia às Universidades Federais, sendo-lhes permitida a revalidação de diplomas de graduação e o reconhecimento de títulos de pós-graduação stricto sensu obtidos no exterior.


Outra mudança é em relação ao uso da Plataforma Carolina Bori, incumbindo ao MEC a disponibilização da plataforma para operacionalização e gestão da política nacional de revalidação e reconhecimento de diplomas estrangeiros que deverá ser adotada por todas as IES brasileiras que estejam aptas a realizar o processo de revalidação e reconhecimento.


A Resolução CNE/CES n.01/22 também iguala os prazos para tramitação simplificada de pedidos de revalidação e reconhecimento em 90 dias, cabendo à universidade pública revalidadora, atenta aos trâmites previstos na Resolução, encerrar o processo de revalidação em até 90 dias contados a partir da data do protocolo do pedido de revalidação. Outros prazos relativos ao processo de reconhecimento de diplomas de graduação expedidos por estabelecimentos de ensino estrangeiros também foram modificados.


Enfim, nesse processo de transferência de alunos do curso de Medicina provenientes do exterior para as IES brasileiras deve-se respeitar o âmbito da autonomia universitária; contudo, nos termos da Resolução CNE/CES nº 01/22, que trata do tema de revalidação de títulos estrangeiros. Ou seja, admite-se que deva ser utilizado um tratamento similar ao que é disposto para a revalidação de títulos estrangeiros para o aproveitamento de estudos, partindo a Instituição de Ensino Superior de uma análise documental da situação do estudante e, sempre que necessário, aplicar testes e exames nesse requerente.


Leia também:





Gostou deste texto? Faça parte de nossa lista de e-mail para receber regularmente materiais como este. Fazendo seu cadastro você também pode receber notícias sobre nossos cursos, que oferecem informações atualizadas e metodologias adaptadas aos participantes. Temos cursos regulares já consagrados e modelamos cursos in company sobre temas gerais ou específicos relacionados ao Direito da Educação Superior. Conheça nossas opções e participe de nossos eventos.


42 visualizações
bottom of page