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Projeto que regulamenta a Telemedicina pode ser pautado nas próximas semanas

Quando decretada a pandemia do coronavírus e o estado brasileiro percebeu a urgência dos atendimentos a distância, foi sancionada a Lei 13.989/2020, que autorizou o uso da Telemedicina.


A lei liberou a prática em caráter emergencial, apenas durante essa adversidade sanitária. Ou seja, é uma legislação temporária que perderá a validade após o período da crise causada pelo coronavírus.


Sem nenhuma outra regulamentação, há um risco de uma lacuna legislativa a respeito do tema e isso em um momento em que já foram realizados milhões de atendimentos a distância, com alto índice de satisfação e eficiência.


Para sermos mais específicos, de acordo com uma pesquisa da Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde), do início da pandemia até agosto de 2021 foram realizados mais de 4,2 milhões de teleatendimentos. Cerca de 90% das consultas remotas foram aptas a resolver as demandas do paciente sem a necessidade de deslocamento, o que, naquele momento, foi de importância ainda mais relevante.


O futuro da saúde pós-pandemia vai continuar abrangendo a telessaúde, gênero do qual a telemedicina é espécie, e precisa receber regulamentação definitiva, que traga segurança jurídica para quem a opera e para os que a utilizam. Deixar de fazê-lo seria um retrocesso. A Telemedicina já é uma realidade no país e a tendência é de expansão.


Antes da pandemia


Mesmo antes da pandemia do coronavírus, a Telemedicina – ainda que proibida - era prática relativamente comum, realizada de maneira informal por meio de plataformas como WhatsApp, Messenger e Facetime.


Até as chamadas teleconsultorias, teletriagens e teleorientações já eram oferecidas por hospitais e planos de saúde. Só não havia regulamentação.

É o que demonstra a reportagem da Folha de São Paulo de fevereiro de 2019, que ainda faz uma comparação com a nossa proposta de regulação da Telemedicina, considerada conservadora em relação a outros países. Naquele ano, nos EUA, no Canadá e em Israel, a pessoa já podia, por exemplo, comprar uma consulta por meio de um aplicativo e falar com o médico por vídeo, em tempo real.


E hoje, referências em saúde como a Inglaterra, cujo serviço público de saúde serve de inspiração para a criação do nosso SUS, libera a totalidade dos atendimentos, mesmo a primeira consulta, via Telemedicina, o que acontece também em outros países da Europa, assim como nos Estados Unidos, Canadá, México, Colômbia, Argentina e outros.


O Projeto de Lei 1998/2020


O Projeto de Lei 1998/2020 foi apresentado em abril de 2020 pela deputada federal Adriana Ventura (NOVO-SP). Segundo a Revista JOTA, divergências entre parlamentares e entidades do setor travaram a votação da proposta. Porém, em dezembro do ano passado, foi aprovada a urgência do projeto e a expectativa agora é que ele seja pauta da Câmara dos Deputados até a primeira quinzena do mês de abril.


O projeto pretende autorizar e definir a prática da Telemedicina no Brasil. Ela é definida como "a transmissão segura de dados e informações médicas, por meio de texto, som, imagens ou outras formas necessárias para a prevenção, diagnóstico, tratamento, incluindo prescrição medicamentosa, e acompanhamento de pacientes".


No PL, poderão ser considerados atendimentos por Telemedicina, dentre outros:


  • a prestação de serviços médicos, via tecnologias da informação e comunicação, em situações em que médicos ou pacientes não estão no mesmo local;

  • a consulta médica remota mediada por tecnologia com médico e paciente localizados em diferentes espaços geográficos;

  • a troca de informações e opiniões entre médicos, com ou sem a presença do paciente, para auxílio diagnóstico ou terapêutico, clínico ou cirúrgico;

  • o ato médico a distância, geográfica ou temporal, com a transmissão de gráficos, imagens e dados para emissão de laudo ou parecer;

  • a realização de procedimento cirúrgico remoto, mediado por tecnologias interativas seguras, com médico executor e equipamento robótico em espaços físicos distintos;

  • a triagem com avaliação dos sintomas, a distância, para definição e referenciamento do paciente ao tipo adequado de assistência que necessita ou a um especialista;

  • o monitoramento para vigilância a distância de parâmetros de saúde e doença, por meio de aquisição direta de imagens, sinais e dados de equipamentos ou dispositivos agregados ou implantáveis nos pacientes em regime de internação clínica ou domiciliar, em comunidade terapêutica, em instituição de longa permanência de idosos ou no translado de paciente até sua chegada ao estabelecimento de saúde;

  • a orientação realizada por um médico para preenchimento a distância de declaração de saúde e para contratação ou adesão a plano privado de assistência à saúde;

  • a consultoria mediada por tecnologias entre médicos e gestores, profissionais e trabalhadores da área da saúde, com a finalidade de esclarecer dúvidas sobre procedimentos, ações de saúde e questões relativas ao processo de trabalho.


Ao médico é assegurada a liberdade e completa independência de decidir se utiliza a telemedicina ou não, podendo indicar a consulta presencial sempre que entender necessário. Da mesma maneira, a prática deve ser realizada por livre decisão do paciente ou de seu representante legal.


Os padrões de qualidade do atendimento de cada especialidade médica serão responsabilidade das respectivas Sociedades Médicas e os Conselhos Regionais de Medicina deverão estabelecer constante vigilância e avaliação das atividades de Telemedicina em seus territórios.


Essa vigilância diz respeito à qualidade da atenção, à relação médico-paciente, à preservação do sigilo profissional, ao registro, guarda e proteção de dados do atendimento.


É bom lembrar que os dados de saúde são dados sensíveis: o projeto de lei faz, inclusive, a previsão da "obediência aos ditames do Marco Civil da Internet e Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais".


O PL prevê que o Conselho Federal de Medicina terá o poder de regulamentar os procedimentos mínimos a serem observados para a prática da Telemedicina e recomenda como boa prática a capacitação para profissionais médicos que queiram exercê-la.


Neste caso, é bom ressaltar que a Telemedicina é uma disciplina de alguns cursos de Medicina no país. Poucos, em verdade, mas a nova lei deve e pode impulsionar que os cursos queiram adequar o currículo à nova realidade do mercado de trabalho. E para os médicos já formados, há cursos de extensão ou atualização em telessaúde, oferecidos por algumas instituições.


A propósito, o modelo flexneriano de ensino da Medicina praticado nas universidades brasileiras já é pauta de debates e discussões e muitos entendem que deve ser modernizado.


O importante é entender que Telemedicina não é uma mensagem por WhatsApp ou uma simples ligação por vídeo.


“Consulta, como ensinado nas faculdades, é um processo com começo, meio e fim; que tem continuidade depois daquele fim”, explica o médico. “Além disso, no atendimento à distância, é fundamental que o médico saiba interagir com uma câmera e desenvolva percepções com as quais ele não está acostumado no presencial, por exemplo.” (Antônio Carlos Endrigo, presidente da Comissão Digital da Associação Médica Brasileira (AMB) e diretor de Tecnologia da Informação da Associação Paulista de Medicina (APM) para a Revista JOTA).

A justificação do projeto


Para a autora do projeto, a ideia é ampliar o acesso, aumentar a qualidade e reduzir o custo dos serviços de saúde no Brasil. Em sua justificação, informa que o país contava em 2020 com 47 milhões de usuários de saúde privada, enquanto mais de 160 milhões de pessoas usufruem do sistema público de saúde.


Nessa perspectiva, em seu entender, a Telemedicina aparece como uma alternativa crítica para, de imediato, permitir o acesso de mais pacientes no sistema - público ou privado-, otimizar a utilização de mão-de-obra especializada, evitar desperdício de recursos, intensificar o acompanhamento remoto de pacientes e facilitar triagens para evitar superlotação desnecessária.


O oferecimento de opções de atendimento de saúde virtual aumentaria, por definição, o acesso das populações ao atendimento médico, notadamente para populações geralmente restritas, como as das zonas rurais, os idosos, as pessoas com dificuldade de locomoção, a população carcerária, oficiais em áreas de fronteiras e os pais e guardiões de menores de idade.


Outras razões apontadas seriam:


  • o acesso a opiniões de diversos profissionais e possibilidade de eventuais intervenções corretivas em fases iniciais de doença ou descompensação clínica, evitando que quadros se agravem antes de conseguirem usufruir de atendimento especializado;

  • a possibilidade de oferecer suporte técnico de médicos especialistas a médicos com menos experiência ou de outras especialidades;

  • o uso da telemedicina como ferramenta de treinamento para cuidadores e familiares de pessoas idosas ou acamadas;

  • a possibilidade de utilizar essa tecnologia para oferecer a pacientes internados “visitas pessoais” através de vídeo-chamada – evitando riscos de contaminação dos familiares e profissionais do hospital em situações de doenças contagiosas.


Um ponto interessante destacado no projeto é que a população brasileira estaria preparada para o uso da Telemedicina, pois, em um universo de 209 milhões de habitantes, o país tem 230 milhões de smartphones e 420 milhões de aparelhos digitais (incluindo tablets, notebooks e computadores) em operação (dados da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP), de 2019).


Perspectivas


O saldo da Telemedicina durante a pandemia foi positivo para o Brasil. O PL 1998/2020 traz para o país a possibilidade de consagrar a integralidade do Sistema Único de Saúde (SUS) para milhões de cidadãos ainda vítimas da negligência assistencial.


Muitos ainda não conseguem atendimento pelas barreiras geográficas/logísticas, o que pode ser sanado pelas novas tecnologias.


O PL traz a escolha do atendimento remoto entregue nas mãos do médico e do paciente. A ideia é trazer mais uma opção de atendimento. Liberdade de escolha e alternativa; não uma obrigação.


Debates ainda serão realizados em relação a alguns tópicos específicos, como, por exemplo, sobre a possibilidade de a primeira consulta ser feita exclusivamente por meio de Telemedicina. Esse tema é, sem dúvida, um dos mais espinhosos.


A remuneração das consultas e a territorialidade também serão objetos de entendimentos futuros.


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