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Ana Luiza Santos e Edgar Jacobs

Um ano de ensino remoto: o que aprendemos até agora

Vivemos um último ano sem precedentes na história e ainda não sabemos ao certo como serão os próximos meses. Apesar dos esforços das Instituições de Ensino em reabrir seus espaços e mantê-los abertos, acolhendo alunos e professores, ainda são complexos os debates sobre as aulas presenciais e o ensino remoto ainda faz parte da realidade de muitas famílias.


O que já podemos extrair da experiência vivida e que caminhos ainda precisamos trilhar para que as experiências na educação sejam aprimoradas?


Inicialmente, como tem sido amplamente divulgado pela sociedade civil envolvida na educação e pela imprensa, é preciso fazer referência ao fato de que houve uma ineficiência ímpar do poder público em verificar se os alunos estavam ou não acompanhando a aulas, se possuíam os mínimos dispositivos tecnológicos para tal, bem como em fomentar melhorias na conectividade da população mais pobre.


De acordo com a pesquisa realizada pelo Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo (USP) e o Centro de Aprendizagem em Avaliação e Resultados da Fundação Getúlio Vargas (FGV), houve demora na apresentação de um plano depois do fechamento das escolas. Em média, as capitais levaram 43 dias para apresentar providências, e os Estados, 34.


Também não houve, de acordo com a pesquisa, oferta suficiente de estratégias de interação com os professores, elemento crucial para políticas de ensino remoto: as interações permitem que sejam consideradas as necessidades e dificuldades específicas de cada aluno, sobretudo em um contexto de elevadas taxas de abandono escolar.


Fato que quase todos os Estados decidiram pela transmissão via internet, mas apenas 15% deles distribuíram dispositivos e menos de 10% subsidiaram o acesso à internet.


Leia:



Os pesquisadores se dizem chocados por, passado um ano de pandemia, ainda não existir um plano B entre os gestores, pois a realidade nos mostra que fechamentos e aberturas ainda serão uma realidade.


Para Luiz Cantarelli, um dos professores envolvidos na pesquisa mencionada, outros problemas graves foram a falta de coordenação nacional por parte do Ministério da Educação e os cortes orçamentários substanciais na área, que dificultam investimentos em acesso ao ensino remoto em 2021. Por questões orçamentárias, por exemplo, o Presidente da República vetou projeto de lei aprovado no Congresso que previa investimento em acesso gratuito à internet para alunos e professores da rede pública.


O ensino remoto


Outra descoberta neste último ano foi a capilaridade do WhatsUpp. Diante da falta de dispositivos mais adequados, as famílias se comunicaram com a escola e com os professores por meio deste aplicativo. O celular, muitas vezes compartilhado por vários membros da família, inclusive, foi uma ferramenta utilizada em larga escala.


Dadas as atuais circunstâncias de crise de saúde pública, a preocupação é como fornecer a melhor instrução remota possível. Vários estudos demonstraram que só oferecer computador ou conectividade ou distribuir apostilas pode não ser suficiente para um engajamento produtivo num momento como esse. A plataforma não pode ser de difícil utilização e, por meio de informações simples, os pais devem ser estimulados a acompanhar o progresso dos filhos. Além disso, é necessário que exista diálogo entre professores e famílias.


Quanto às aulas remotas em si, a pesquisa apresentada no Metro Atlanta Policy Lab for Education salienta que os alunos se beneficiam de uma interface direta e simples. As melhores práticas incluem:


  • fornecimento de explicações didáticas simples e claras,

  • estímulo de interações entre colegas e professores,

  • uso de jogos e simulações para ajudar a manter os alunos envolvidos, e

  • ter certeza de que o suporte material e tecnológico está disponível.


As recomendações são para que os professores foquem no básico ao adaptar o currículo. Oferecer muito conteúdo novo de uma só vez, por exemplo, não é uma boa prática e antes de fazê-lo o professor deve se certificar de que os alunos possuem as habilidades prévias.


Dar um retorno aos alunos sobre as atividades feitas à distância também é muito importante e os estudos mostram que isto motiva e melhora o desempenho dos alunos.


Autonomia dos estudantes


Ainda em 2020, quando estávamos há ‘apenas’ 06 meses enfrentando a pandemia, já estava claro que nunca havia sido tão importante saber quando e como estudar.


Hoje sabemos com mais clareza que o ensino remoto se beneficia do estudante como um sujeito ativo, com capacidade de controle sobre seu processo cognitivo e motivacional, conseguindo captar, organizar e transformar as informações adquiridas ao longo do tempo.


favorece uma autonomia no aprender, sendo extremamente benéfico para o aluno, que também conta com fatores pessoais, como idade e maturidade, bem como sociais e financeiros para atingir esse objetivo.


Leia:



Efeitos da pandemia no dia a dia


Reportagem da BBC News Brasil aponta estudo da Universidade Federal de Minas Gerais com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) com 9,4 mil adolescentes brasileiros, ouvidos entre junho e setembro de 2020: os resultados da pesquisa apontam que 59% dos estudantes diziam ter falta de concentração e 47,8% afirmavam estar entendendo pouco das aulas à distância.


Em dezembro, quando o Instituto Península entrevistou 2,9 mil professores do país, 60% disseram que os alunos remotos não apresentavam evolução no aprendizado. Quase a totalidade destes professores apostava no aumento da desigualdade educacional entre os alunos mais carentes.


A mesma reportagem cita um terceiro estudo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro e a Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, que verificou sinais de que crianças de 4 e 5 anos estavam com mais dificuldades de expressão oral e corporal. As mais afetadas são sempre as mais vulneráveis, que têm menos assessoria dentro de casa. Crianças que podem pintar, desenhar, recortar e ouvir histórias de seus pais ou cuidadores se beneficiam imensamente.


Os professores


Os professores trabalharam e tem trabalhado em condições muito adversas nesta pandemia e os impactos são mundiais. Muitos estão neste período gerenciando a própria família, com os próprios filhos em ensino remoto e com aumento no volume de trabalho do aprendizado não presencial.


Muitos foram os relatos de ansiedade, perda de sono, ruptura no relacionamento, bem como aumento do uso de álcool. É que a pandemia levou a um grande acréscimo na carga de trabalho e, embora a grande maioria das instituições de ensino tenham respondido às situações com agilidade e profissionalismo, as circunstâncias causaram um efeito prejudicial na saúde física e mental dos professores.


Levantamento do Instituto Tim, por exemplo, mostrou que 58% dos docentes não conseguiram dar aulas sem barulhos e interrupções em casa. Problemas relacionados ao sono atingiram 78% dos profissionais. A mesma pesquisa também atestou o que o senso comum dita: professores pardos e negros foram mais impactados pela pandemia. Entre as pessoas negras, 76% mencionaram dificuldades de adaptação às aulas on-line, 64% não conseguiram trabalhar bem de casa e 83% tiveram problemas de sono durante a pandemia. O contexto familiar transpareceu as diferenças neste aspecto: 79% dos professores negros afirmaram que suas famílias perderam parte da renda durante a crise sanitária, contra 61% dos profissionais brancos.


Leia:



Esperança


A pandemia Covid-19 oferece uma oportunidade para repensarmos o que realmente importa na educação. Mesmo antes da crise de saúde, alguns sistemas escolares já estavam desconectados das realidades e necessidades dos alunos.


Mesmo nas economias desenvolvidas (quiçá nas em desenvolvimento) os sistemas de ensino ainda dependem de formas passivas de aprendizado, sempre focando na instrução e na memorização. Poucas são os sistemas com métodos interativos que promovem o pensamento crítico e individual necessário na economia atual impulsionada pela inovação.

Segregação socioeconômica, alta evasão escolar, pouco sucesso no aprendizado, professores pouco capacitados e salas de aula muito cheias também são questões que atingem grande parte dos países.


A pandemia não deixa de ser um alerta para a educação. Já pudemos constatar que os meios digitais por si só não são suficientes para a formação social do indivíduo; percebemos que o ambiente escolar e universitário é um fator determinante na construção da personalidade e desenvolvimento de competências e habilidades sociais do aluno.

Segundo a UNESCO (2020), a resposta educacional à COVID-19 deve:


priorizar a colaboração e trabalhar em parcerias; estimular a colaboração multissetorial (educação, saúde, social e comunitária, entre outros); facilitar o aprendizado entre pares (que inclui o compartilhamento de experiências, informações, desafios, ideias, soluções e lições aprendidas); e fortalecer comunidades de prática para professores”.

E que possamos ter uma oportunidade real de "reconstruir melhor", aproveitando esta crise sem precedentes para desenvolver processos que nos permitam agir com mais eficácia, agilidade e resiliência, oferecendo para a comunidade escolar soluções emergenciais inovadoras efetivas.

Precisamos aprender com os erros passados, nos espelhar nos sucessos e bons exemplos de dentro e fora do país e, depois de mitigar os danos causados pelo fechamento das escolas, planejar para que, quando a medida se fizer necessária novamente, exista mais acesso às tecnologias em sistemas de aprendizagem remota, a sistemas de alerta precoce para evitar o abandono escolar e a pedagogias adequadas para que se mantenha a construção de habilidades fundamentais. Isto, claro, juntamente com um aumento do suporte para pais, professores e alunos.


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